A taxa de mortalidade infantil em crianças de até cinco anos de idade caiu 52% de 2000 a 2023, segundo um novo relatório do Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância), divulgado no último dia 24.
De acordo com os dados coletados pela agência, em 2000 a taxa de mortalidade de crianças com menos de cinco anos era de 77 mortes a cada mil nascidos vivos. Em 2023, esse índice caiu para 37 mortes a cada mil nascidos vivos. Na década anterior (1990), a taxa era ainda mais elevada, de 94 mortes por mil.
No mesmo período, o número de mortes de crianças de até cinco anos também foi reduzido pela metade, passando de 10,1 milhões de óbitos, em 2000, para 4,8 milhões, em 2023.
Os esforços para a redução da mortalidade infantil, porém, desaceleraram na última década, ainda segundo o Unicef. Se de 2000 a 2015 a redução anual da mortalidade infantil era de 3,7%, esse valor passou para 2,2% no período que compreende 2015 a 2023 —uma desaceleração de 42%.
Além disso, a agência faz um alerta para o fato de as mortes infantis nos primeiros cinco anos de vida serem, em geral, mortes evitáveis, que poderiam ser contornadas caso todas as crianças tivessem acesso igual aos serviços de saúde, nutrição e proteção.
De acordo com o órgão, é preciso unir esforços globais para reduzir ainda mais as mortes infantis, e não deixar que o cenário se agrave. Segundo a estimativa do Unicef, até 2030, 30 milhões de crianças podem morrer antes do 5º aniversário de vida —incluindo aproximadamente 2 em cada 5 mortes de neonatos, isto é, no primeiro ano de vida.
Nesse sentido, o relatório chama atenção para o fato de o financiamento global para a saúde estar sob pressão crescente, especialmente com os cortes de investimentos que podem ser especialmente necessários em países onde as taxas de mortalidade infantil são elevadas, como a África Subsaariana e o Sul da Ásia.
Tal apelo vem em um momento em que o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump (Republicanos), anunciou a retirada do Usaid —principal agência assistencial americana, responsável por programas de ajuda global contra o HIV/Aids e a mortalidade infantil em países pobres do mundo, entre outras ações.
”Simplificando, se o apoio aos serviços que salvam vidas não for mantido, muitos países podem esperar um ressurgimento de mortes de recém-nascidos e crianças até os cincos anos”, diz o Unicef.
O levantamento lembra, ainda, que as mortes de crianças abaixo dos cinco anos são “especialmente trágicas, pois as intervenções para preveni-las são bem conhecidas e estão ao alcance de todos: acesso a serviços de saúde essenciais, partos assistidos por profissionais qualificados, cuidados pré-natais e pós-natais, vacinações de rotina, prevenção de lesões e programas abrangentes de nutrição”.
”O custo da inação é alarmante, tanto em termos de vidas perdidas quanto de consequências sociais a longo prazo. Investir na sobrevivência infantil é um investimento que traz retorno em capital humano, desenvolvimento econômico e melhorias para futuras gerações”, completa o texto.
Os dados divulgados em março pelo Grupo Interagências das Nações Unidas para a Estimativa da Mortalidade Infantil (UN IGME) fazem um alerta ainda sobre as disparidades assistenciais e como elas afetam o risco de uma criança vir a óbito nos seus primeiros anos de vida.
O relatório revela que a probabilidade de uma criança morrer antes de completar os 5 anos é 80 vezes maior no Níger, país com a maior taxa de mortalidade infantil –115 mortes por mil nascidos vivos– em comparação a San Marino, com a menor taxa –1,4 mortes por mil.
O estudo também comparou as regiões globais em relação à taxa regional de mortalidade infantil. A África Subsaariana teve a maior taxa de mortes infantis até os cinco anos, com 69 mortes por mil nascidos vivos, posição mantida desde a década de 1990 –quando os primeiros dados estavam disponíveis. Já a Austrália e Nova Zelândia compreendem a região com as menores taxas –4 mortes por mil nascidos vivos–, seguida da Europa (4) e América do Norte (6).
No caso do Brasil, a taxa de mortalidade abaixo dos cinco anos passou de 63 mortes a cada mil nascidos vivos, em 1990, para 34, em 2000, e chegou ao patamar de 14 mortes em 2023, uma redução média de 4,5% ao ano nas últimas três décadas. A introdução do Programa Nacional de Imunizações (PNI), em 1973, e a criação do SUS (Serviço Único de Saúde), em 1988, contribuíram para essa redução.
AVANÇO DO SARAMPO E VACINAÇÃO
Em 1963, com a introdução da vacina contra o sarampo, uma mudança drástica nas taxas de sobrevida infantil foi observada em todo o mundo. Segundo o Unicef, o impacto da vacinação na mortalidade de menores de cinco anos foi enorme, com os óbitos por sarampo caindo para praticamente zero em países onde a vacina está presente como rotina.
Por essa razão, traz preocupação o avanço do sarampo em países onde a doença havia sido controlada nas últimas décadas. Nesta semana, os EUA registraram a segunda morte de uma criança por sarampo em quase uma década —resultado do surto atual de sarampo entre os estados do Texas, Novo México e Oklahoma, que já registram centenas de casos.
Em especial, preocupa a postura do atual secretário de Saúde americano, Robert F. Kennedy Jr., que se posicionou diversas vezes contrário à vacinação, coloca em risco a saúde pública no país.
A eficácia da vacina contra sarampo é de 95% e, nos países onde ela foi introduzida, as mortes infantis por sarampo caíram de 80% a quase 100%, como é o caso da Nigéria, onde a doença viral ceifava cerca de 100 mil mortes por ano de crianças abaixo de cinco anos até o ano 2000, quando a taxa de vacinação era de cerca de 33%. As mortes caíram para 3.100 mortes em 2023, quando mais de 60% das crianças foram vacinadas contra o sarampo.
Ao longo dos últimos 60 anos, milhões de vidas foram salvas graças à vacinação, diz o Unicef. “Investimentos contínuos são necessários na vacinação contra o sarampo e, de fato, em todas as vacinas eficazes contra doenças da infância, para conseguir manter e ampliar os ganhos que tivemos na sobrevivência infantil”, completou a agência.
*Por Ana Bottallo | Folhapress