Liderados pela esquerda, protestos contra Bolsonaro reúnem manifestantes nas ruas em meio à pandemia

Manifestações ocorrem nos grandes centros. Foto: Mauro Pimentel/AFP

Protestos contra o presidente Jair Bolsonaro liderados por centrais sindicais, movimentos sociais e partidos de esquerda reúnem manifestantes em várias cidades do país. Na manhã deste sábado (29), há atos em capitais como Rio de Janeiro, Salvador, Belo Horizonte e Recife.

As manifestações, que foram alvo de críticas por acontecerem presencialmente em meio à pandemia da Covid-19, são realizadas num momento em que o país chega a 459 mil mortes pela doença, sendo 2.418 registradas em 24 horas. Pelo menos nove capitais, além do Distrito Federal, têm ocupação acima de 90% dos leitos de UTI.

A expectativa da organização é que atos semelhantes aconteçam até o final do dia em cerca de 200 cidades, incluindo as 27 capitais. Em São Paulo, o protesto está marcado para as 16h com concentração em frente ao Masp, na avenida Paulista.

Como mostrou a Folha, a mobilização nacional deste sábado foi feita pensando em desgastar Bolsonaro e incentivar a CPI da Covid, enquanto o impeachment é visto como algo ainda distante. Líderes ligados à organização, porém, enxergam os atos como um impulso.

O dilema entre o discurso pró-isolamento social e o incentivo a aglomerações resultou em diferentes níveis de participação. A CUT (Central Única dos Trabalhadores) e o MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) não convocaram seus integrantes institucionalmente, embora não impeçam a ida.

PT, PSOL, PC do B, PCB, PCO e UP declararam apoio à iniciativa e dispararam chamados para os militantes, mas ressaltaram que a organização é de responsabilidade de frentes Povo sem Medo, Brasil Popular e Coalizão Negra por Direitos (que congregam dezenas de entidades).

Mesmo entre os partidos que endossaram a iniciativa não houve unanimidade. Em estados como a Bahia, por exemplo, o PT do governador Rui Costa incentivou a realização de atos virtuais.

Em Pernambuco, o Ministério Público estadual emitiu uma recomendação de suspensão dos atos marcados para este sábado, para evitar a disseminação do vírus. Ele expediu recomendações semelhantes contra aglomerações em manifestações de apoio ao presidente Bolsonaro.

Mesmo com a recomendação, o protesto foi mantido pelos organizadores. Mas houve baixas: o PT de Pernambuco orientou aos seus militantes que não participassem do ato presencial.

No Rio de Janeiro, manifestantes começam a se reunir no centro na manhã deste sábado na avenida Presidente Vargas, na altura do Monumento Zumbi. O protesto tem as seguintes pautas: ”Pela vida, por vacina, pelo auxílio digno e contra os cortes na educação”. Os organizadores também pediram que os manifestantes levassem um quilo de alimento não perecível.

No último domingo (23), a capital fluminense foi palco de uma mobilização pró-Bolsonaro. Três dias após dizer em live que voltou a ter sintomas da Covid-19, o presidente fez um passeio de moto com público estimado em 10 mil a 15 mil pessoas pela prefeitura carioca.

Ao final, ele fez um discurso criticando as medidas restritivas adotadas para conter a pandemia, causando aglomeração. Também sem máscara, o ex-ministro da Saúde general Eduardo Pazuello esteve ao lado dele em cima de um carro de som.

Em Belo Horizonte, os manifestantes se reúnem na Praça da Liberdade, região centro-sul da cidade. O local é o mesmo utilizado para atos organizados por correligionários do presidente.

O protesto começou por volta das 10h. Com bandeiras e camisas vermelhas, os manifestantes seguirão em passeata até o centro. Os organizadores do ato avisam sobre a necessidade de distanciamento de dois metros entre os participantes, uso de máscaras e álcool em gel.

Uma carreata também começa a ser organizada para quem não se sentir seguro de participar da passeata. Em Salvador, a concentração do protesto acontece na praça do Campo Grande, região central, e reúne manifestantes com cartazes e bandeiras contra Bolsonaro.

Forças da oposição de esquerda estavam rachadas nos últimos meses sobre ir às ruas em meio à pandemia de Covid-19, mas entenderam que o descontrole do vírus e os índices de desemprego e fome exigem a realização de protestos.

Para neutralizar as críticas, tanto entre apoiadores quanto entre detratores do governo, os articuladores deram orientações de segurança para as pessoas que irão aos atos, como o uso de máscara adequada (do tipo PFF2) e a ordem de manter distanciamento nas passeatas.

As manifestações deste sábado abraçam ainda pautas como a aceleração da vacinação contra a Covid, o retorno do auxílio emergencial de R$ 600, a luta antirracista, o combate à violência policial, o ataque às privatizações e a defesa da educação pública.

Embora partidos e movimentos por trás da convocação afirmem que o mote ”fora, Bolsonaro” traduz o desejo de afastamento imediato, líderes admitem haver obstáculos para o desenrolar de um processo. Eles, no entanto, enxergam as mobilizações como um passaporte que pode levar a esse destino.

A avaliação é que o impeachment pode ganhar força a partir da ocupação das ruas. Por isso, o esforço é para pressionar o centrão, fiel a Bolsonaro e uma barreira para o processo na Câmara, e o presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), a quem cabe desengavetar um dos 114 pedidos protocolados.

Na quarta-feira (26), centrais sindicais e movimentos sindicais fizeram um protesto em Brasília, no gramado em frente ao Congresso Nacional, para denunciar o aumento da fome no país, reclamar da gestão da crise sanitária e pedir o reajuste no valor do auxílio emergencial.

A iniciativa foi tratada como um ato simbólico, com a presença de número reduzido de pessoas e transmissão dos discursos pelas redes sociais. Os manifestantes procuraram congressistas para expor suas bandeiras e fizeram doação de alimentos para catadores de material reciclável.

*por João Pedro Pitombo, Júlia Barbon e Leonardo Augusto / Folha de São Paulo