Documento mostra que ordem para repreender ato no Recife foi do comandante-geral da PM

Homem perde olho após ato no Recife. Foto: Estadão Conteúdo

Um documento oficial da comunicação interna da Polícia Militar de Pernambuco revela que foi do então comandante-geral da corporação a ordem para repreender com violência o protesto realizado dia 29 contra a atuação do governo Jair Bolsonaro. Vanildo Maranhão foi exonerado do cargo pelo governador Paulo Câmara (PSB) nesta semana.

O ato foi dispersado com balas de borracha e bombas de gás lacrimogêneo. Na ação, duas pessoas ficaram cegas de um dos olhos. Os detalhes de toda a operação foram revelados neste sábado, 5, pelo Jornal do Comércio e confirmados pelo Estadão.

O relato destinado ao subcomandante do Batalhão de Choque, major Valdênio Corrêa Gondim Silva, foi feito por um oficial que teve o nome preservado. No ofício, ele afirma que, ”por determinação do comandante-geral da PMPE”, a Tropa de Choque deveria realizar a dispersão dos manifestantes usando dos ”meios dispostos”.

Em seguida, o policial informa que a tropa foi hostilizada pelos manifestantes durante a tentativa pacífica de dispersão e até mesmo atacada com pedras. Diante da situação e da ordem já dada, foi então feita a ”utilização escalonada da força dos materiais de menor potencial ofensivo e das técnicas e táticas de controle de distúrbios civis”.

Ainda de acordo com o documento, o objetivo da ação policial seria o de defender o decreto estadual de restrições sociais, que vetava manifestações – naquele sábado o grupo reunia cerca de 300. O documento também pontua que o ataque dos oficiais só teve início após os policiais serem agredidos por dois manifestantes com paus e pedras, além de xingamentos.

A repercussão negativa da ação e a postura do governador Paulo Câmara, que sempre negou ter dado qualquer ordem no sentido de repreender o ato, já haviam provocado, além da queda de Maranhão, a demissão do secretário de Defesa Social, responsável pelo comando da Polícia Militar de Pernambuco (PMPE), Antonio de Pádua. Ele colocou o cargo à disposição na tarde de sexta-feira, 4, e foi substituído interinamente por Humberto Freire, que é delegado da Polícia Federal (PF).

”Os fatos ocorridos no último sábado foram graves e precisam ser investigados de forma ampla e irrestrita. Minha formação profissional e humanística repudia, de forma veemente, a maneira como aquela ação foi executada. Seis dias depois do episódio, com um novo comandante à frente da PM, com todos os procedimentos investigatórios instaurados e após prestar contas à Assembleia Legislativa, à OAB e ao Ministério Público, entreguei meu cargo ao governador Paulo Câmara, com a certeza do dever cumprido e mantendo nosso compromisso com a transparência e o devido processo legal”, declarou Antonio de Pádua em nota.

Na manhã da sexta-feira, Câmara já havia empossado o novo comandante da PMPE, o coronel Roberto Santana, que assume o posto do coronel Vanildo Maranhão. ”A missão dada ao secretário Freire e ao comandante Roberto é que o episódio do último sábado não seja esquecido, para que nunca se repita. Os protocolos precisam ser revistos para que um comando de tropa na rua não possa se sentir autônomo a ponto de agir da maneira que agiu”, disse o governador.

O governo garante que vai indenizar as vítimas e apurar o caso. Segundo especialistas, a ação expõe o risco de radicalização política nas PMs. A reportagem ainda não conseguiu contato com o governo para comentar sobre o documento da PM.

*por Pedro Jordão/Estadão Conteúdo