Com alerta de colapso na saúde, Ministério Público atua para tentar impedir festas juninas

Com o alerta feito por gestores da Saúde para um possível colapso do sistema com uma onda de novos casos de Covid-19 depois do São João, o Ministério Público da Bahia (MP-BA) expediu diretamente a nove municípios, nos últimos dois dias, recomendações para que coíbam festejos juninos. Além disso, a procuradora-geral de Justiça Norma Cavalcanti expediu uma recomendação geralaos promotores de Justiça para que ajam nos municípios com o intuito de cobrar das prefeituras medidas que impeçam eventos com aglomerações.

Na recomendação geral, publicada no Diário de Justiça, a chefe do MP orienta, com o respeito à independência funcional, que os promotores recomendem aos prefeitos o cancelamento de qualquer evento público planejado ou patrocinado pelas prefeituras – como festas, shows, feiras e quadrilhas – independentemente do público previsto, com ou sem venda de ingresso.

Além disso, a procuradora-geral recomenda a revogação de quaisquer autorizações e alvarás sanitários eventualmente expedidos para a realização de festejos juninos privados, também independentemente do número de participantes.

Na peça, ainda é recomendada às prefeituras a adoção de providências para não permitir festas, por meio do exercício do poder de polícia.

Promotores já recomendaram diretamente aos municípios de Bom Jesus da Lapa, Serra do Ramalho, Sítio do Mato, Paratinga, Cícero Dantas, Fátima, Heliópolis, Paripiranga e Adustina que proíbam festas no período.

Colapso – Com o avanço da variante gama (ou P.1) do coronavírus e a proximidade dos festejos juninos, o secretário de Saúde da Bahia, Fábio Vilas-Boas, afirmou que o estado não terá condições de absorver no sistema de saúde o resultado de uma onda de contaminação semelhante à ocorrida após o São João do ano passado.

Em vídeo publicado nas redes sociais, o titular da Sesab disse que a pasta já se prepara para uma onda pós-São João, mas fez um apelo ”à consciência e ao bom senso” da população para evitar um cenário ainda pior.

”Nós estamos muito preocupados com o que acontecerá logo após os festejos juninos, porque, além de haver aglomerações tradicionais nas fazendas, sítios e casas, nós estamos com uma proporção maior de uma variante mais agressiva, que é a chamada variante P.1 [registrada inicialmente em Manaus]”, afirmou o secretário.

De acordo com Vilas-Boas, entre fevereiro e maio deste ano, a variante P.1 se tornou predominante, sendo a responsável pela aceleração do número de internações e elevação do número de óbitos em todo o Brasil, inclusive na Bahia. Conforme boletim do Laboratório Central de Saúde Pública (Lacen), a P.1 é responsável atualmente por 80% das infecções na Bahia.

O laboratório já fez o sequenciamento de 257 genomas completos de pacientes de 98 municípios dos nove Núcleos Regionais de Saúde do estado entre setembro de 2020 e maio deste ano. Até então, não foi identificada nenhuma amostra com a variante delta (indiana). Conhecida com a variante do Reino Unido, a B.1.1.7 (ou alfa) era a mais comum no estado no início da pandemia.

”Temos uma situação elevada de ocupação das UTIs em todo o estado, superior a 83%. E nós não temos a mesma capacidade de absorver a onda que vai acontecer após o São João como aconteceu em 2020, com aumentos de 500% a 800% no número de casos em algumas cidades do interior”, comparou o secretário.

Caso ocorram no período, os encontros devem ser limitados às pessoas mais próximas e em ambientes ao ar livre, destacou Vilas-Boas. ”Se tiver que fazer algum tipo de festejo, que faça dentro da sua bolha familiar, com as pessoas com as quais já convive habitualmente, e que faça isso ao ar livre. O convívio ao ar livre reduz drasticamente a chance de contagiar-se com a Covid-19”, apontou.

Sem perspectiva de abertura de novos leitos e com alta ocupação, Feira de Santana avalia suspender o feriado de São João, no dia 24. Segundo o site Acorda Cidade, o prefeito Colbert Martins negocia com os sindicatos patronal e dos comércios o adiamento do feriado. ”Nós estamos definindo isso, mas a posição do município será por adiar o feriado. Parar uma cidade dessa numa quinta-feira, com a tradição cultural que nós temos aqui, vamos acabar provocando mais aglomeração e mais transmissão”, declarou Colbert.

Em um estudo realizado entre abril e maio no município, pesquisadores coletaram 1,4 mil amostras em pessoas não vacinadas que não tinham tido Covid-19 anteriormente e não apresentavam sintomas da doença. Do total, 143 pessoas assintomáticas foram detectadas com o vírus.

A variante com maior incidência entre os grupos foi justamente a P.1. ”É uma variante de alta transmissibilidade e circula com grande proporção em Feira de Santana. Conseguimos detectar um grande número de pessoas infectadas, sem sintomas, circulando pela cidade, com uma carga viral muito alta e, muitas vezes, sem utilizar as medidas de prevenção necessárias para evitar a contaminação de outras pessoas”, aponta o professor pesquisador Luiz Alcântara.

Coordenadora do Comitê de Enfrentamento ao Coronavírus em Feira, a infectologista Melissa Falcão diz que o órgão aconselhou à prefeitura reduzir o horário de funcionamento de bares e restaurantes. ”A perspectiva não é boa a curto prazo. O feriado vai ser suspenso para evitar que as pessoas viajem para outras cidades, contaminando outras pessoas ou se contaminando”, afirma.

O presidente da União dos Municípios da Bahia (UPB), Zé Cocá, também expressou preocupação com o cenário nas semanas seguintes ao São João. “A gente viu um boom de casos logo após a Semana Santa, quando as famílias se reuniram, e o São João é preocupante. Se a população não tiver consciência, não tem órgão fiscalizador que conseguirá conter a situação. É momento de manter o distanciamento, não aglomerar, para que a gente não tenha uma terceira onda com muito mais força”, disse Cocá, prefeito de Jequié.

Transporte – Para evitar o deslocamento, o governo do Estado interromperá o transporte intermunicipal durante o período. Conforme decreto publicado, será suspensa, a partir da meia-noite do dia 21 de junho, a circulação e a saída, e, a partir das 9h de 21 de junho, a chegada de qualquer transporte coletivo intermunicipal rodoviário, público e privado, nas modalidades regular, fretamento, complementar, alternativo e de vans. A restrição vale até as 5h de 28 de junho.

A circulação, a saída e a chegada de ferry boats, catamarãs, lanchinhas e balsas também ficam proibidas das 20h do dia 21 de junho até as 5h de 28 de junho, em todo território baiano.

Para vigiar o cumprimento do decreto que proíbe aglomerações, a Polícia Militar terá o reforço de 7,5 mil policiais em todo o estado. Os agentes serão adicionados ao efetivo total da corporação, que conta com 32 mil policiais em toda a Bahia, e receberão em regime de pagamento de horas extras.

“Essa mobilização de efetivo vai gerar um investimento de R$ 1,1 milhão de deslocamento, pagamento de horas extras, diárias. A gente pega o pessoal de folga em regime extraordinário e incrementa esse policiamento nessas cidades”, explica o major Edmundo Assemany, oficial do Comando de Operações Policiais Militares (COPPM).

Denúncias de aglomerações e festas clandestinas podem ser feitas através do 190 ou do novo número do Disque Denúncia, 181, que atende toda a Bahia. *A Tarde