O IPTU e a classe média

Karla

O IPTU de Salvador até o exercício de 2013 possuía alíquotas que variavam em função do padrão construtivo dos imóveis residenciais. Ou seja, de 0,1% para os precários até 1,0% para os considerados de alto luxo. Era uma forma de progressividade dentre milhares existentes, embora contestável, pois como é notória, essa variação só pode ocorrer em virtude do valor venal, da localização ou utilização, de acordo com os ditames constitucionais.

A lei 8421/13, sancionada em 15/07/13, inclusive, prevê no seu artigo 69, inciso II que o padrão construtivo seja também considerado, mas acoplado a outros fatores de correção. Ao analisar um caso concreto, percebe-se que o imóvel classificado anteriormente como BOM, alíquota de 0,4%, sofreu aumento, pois as variações passaram a ser consideradas conforme a faixa de valor, de forma progressiva, estabelecendo que imóveis acima de 322 mil indistintamente, passariam a ter uma alíquota de 1%. Comprova-se, portanto, que a classe média soteropolitana proprietária de imóvel teve que suportar uma majoração de alíquota, quase triplicada, de 0,4% para 1%.

Tratando-se do valor venal, com a alteração da planta genérica de valores, automaticamente aumentaram os campos de cálculo de terreno e área construída. Visualiza-se o real valor, ao somar os campos A+B do boleto da notificação de lançamento do IPTU 2014. Sobre ele incidirá a alíquota correspondente que só pode ser checada na Instrução Normativa 12/13, quando o contribuinte verifica em que faixa se encontra o seu imóvel e qual a parcela a ser deduzida, redundando, assim, no valor do imposto em patamares elevados. Salutar esclarecer que não são consideradas isentas todas as residências de valor venal de até R$ 80.000,00. O benefício só pode ser concedido para um único imóvel do mesmo contribuinte, conforme art.83, § 3º.

Pela primeira vez na história da administração tributária municipal o IPTU tornou-se o principal tributo. Não se consegue entender tamanho desinteresse quanto ao Imposto Sobre Serviços – ISS que tem um vasto campo para alargamento da sua base tributária.

Um fato é o limite de aumento de 35% em relação ao ano anterior, mas para o cidadão que era isento e, portanto, livre do IPTU, o acréscimo foi de 100%, utilizando-se esse mesmo raciocínio para a TRSD (taxa de lixo). A SEFAZ confirmou que a geração da dívida do IPTU se baseou nos dados oferecidos no recadastramento cujas informações ainda não foram validadas e não no cadastro imobiliário existente. É provável que esses fatos tenham gerado muitas distorções.

Se houve redução na carga tributária, principalmente em relação às alíquotas, seria interessante que a gestão fazendária demonstrasse que a classe média não foi tão prejudicada e que os seus imóveis efetivamente tiveram suas alíquotas diminuídas.

Os dados oficiais indicam que houve aproximadamente 7.000 impugnações eletrônicas, entretanto é possível que este número alcance mais de duzentas mil. Situação extremamente delicada num momento em que o Conselho Municipal de Tributos, órgão julgador administrativo de última instância, criado na atual gestão, ainda está sem funcionar. Vale registrar que o site da SEFAZ só permite que o contribuinte conteste o seu imposto até o limite de 30% de redução do valor cobrado, do contrário, deve-se ingressar com processo administrativo ou optar pela via judicial.

Talvez o imbróglio do IPTU pudesse ter sido evitado se alguns riscos sinalizados por técnicos que colaboraram com o projeto tivessem sido avaliados com cautela. Não se constrói uma relação confiável com o contribuinte, impondo a ele um pesado tributo. A transparência deve ser a tônica. É preciso oferecer ao cidadão condições para que ele identifique se o valor cobrado corresponde ao legalmente exigido. Isso se chama DEMOCRACIA!

Karla Borges é Auditora Fiscal da Secretaria Municipal da Fazenda do Salvador há 23 anos, graduada em Administração de Empresas (UFBA) e Direito (FDJ) ,Pós-Graduada em Administração Tributária (UEFS), Direito Tributário, Direito Tributário Municipal (UFBA), Economia Tributária (George Washington University) e Especialista em Cadastro pelo Instituto de Estudios Fiscales de Madrid.

Deixe um comentário