Mesmo que as eleições municipais de outubro não sejam adiadas, como já sugerem parlamentares e integrantes do Judiciário, a pandemia do novo coronavírus já alterou significativamente o trabalho da Justiça Eleitoral para a realização do pleito.
Entre as medidas que têm sido tomadas estão o adiamento e a remodelação de testes previstos para os sistemas eleitorais, além do treinamento remoto dos coordenadores dos mesários.
O TSE (Tribunal Superior Eleitoral) também já descarta utilizar nas eleições deste ano as novas urnas eletrônicas que estão em um processo de compra que pode chegar ao valor global de aproximadamente R$ 800 milhões.
Para que as eleições de outubro sejam adiadas é necessário que o Congresso aprove uma PEC (proposta de emenda à Constituição). A tendência atual entre os parlamentares é, em caso de adiamento, que ele aconteça para uma data ainda em 2020, sem extensão de mandatos.
Para avaliar o impacto da pandemia sobre as eleições, a ministra Rosa Weber (Supremo), que é a atual presidente do TSE, criou um grupo de trabalho formado pelos chefes de setores técnicos do órgão.
Todas as segundas-feiras o grupo divulga relatórios e informa se há condições para que as eleições sejam realizadas nas datas previstas atualmente, em 4 de outubro (1º turno) e 25 de outubro (2º turno).
Até agora, após duas semanas de funcionamento, a conclusão é a de que há condições para isso, embora alguns procedimentos tenham que ser adiados e outros, alterados completamente. A ideia é que o grupo de trabalho analise semanalmente se esse cenário irá mudar.
Coordenador do grupo e secretário-geral da presidência do TSE, Estêvão Waterloo diz que a portaria que criou a equipe é “bastante enxuta, porém muito objetiva”.
“Temos que apresentar um relatório semanal à presidente do tribunal. Esse relatório é divulgado no momento em que é remetido à presidência”, diz Waterloo à Folha. “O GT [grupo de trabalho] tem autonomia, mas é extremamente técnico, não faz avaliação política”.
As reuniões do grupo acontecem por videoconferência, uma vez por semana, após cada área técnica levantar informações atualizadas sobre o setor que comanda. A partir dessa reunião é elaborado o relatório.
O grupo analisa o que poderá e o que não poderá ocorrer em consonância com o cronograma da Justiça Eleitoral de 2020 elaborado antes da pandemia. Caso encontrem obstáculos ou pontos críticos que impeçam a votação, devem alertar o tribunal. Se não, programam apenas alterações internas pontuais para que não haja contratempos.
Como a Folha apontou em março, testes com as urnas foram abortados ou adiados indefinidamente devido à crise da Covid-19. Ao contrário do otimismo do grupo de trabalho do TSE, integrantes de TREs (Tribunais Regionais Eleitorais) dão como certo que haverá adiamento da eleição.
Futuro presidente do TSE, o ministro Luís Roberto Barroso disse que esses testes e eventuais aglomerações nas convenções partidárias de agosto, quando as legendas escolhem seus candidatos, serão cruciais para definir se a data da eleição será alterada.
No final de abril, uma primeira rodada de testes do sistema de prestações de contas da eleição aconteceu de forma remota, com os técnicos trabalhando em esquema de home office. A iniciativa foi inédita na Justiça Eleitoral.
Em maio, os testes dos sistemas de candidatura e de propaganda eleitoral serão realizados também remotamente —antes, eles aconteceriam presencialmente no TRE de Curitiba.
Ainda não foram remarcados, no entanto, testes físicos com as urnas, que avaliam defeitos em teclas, por exemplo, ou em impressoras de boletins. Essa avaliação terá que acontecer presencialmente.
“Evidentemente, no caso dos testes das urnas eletrônicas vai ter que haver pessoas atuando, digitando nas urnas, diretamente nos equipamentos. Mas essas pessoas estarão afastadas. Será um formato diferente e isso está sendo remodelado para essas novas condições aconteçam”, afirma Giuseppe Janino, secretário de tecnologia de informação do TSE.
Outra mudança será no treinamento dos chamados “multiplicadores dos regionais”, os funcionários dos TREs que vão a Brasília ajudar a finalizar o conteúdo do treinamento do TSE para os mesários.
Em vez de viajarem à capital federal, eles irão receber treinamento a distância. Segundo o TSE, a medida terá pequenos custos, devido à produção de material que será exibido esses servidores, mas essas despesas serão compensadas com a economia que o tribunal terá com passagens e diárias.
“É um custo muito pequeno porque [o curso] é uma produção interna, a gente não contrata ninguém de fora para fazer”, diz Thayanne Fonseca, secretária de gestão de pessoas do TSE.
“No presencial a gente teria uma urna eletrônica, com todo mundo trabalhando com ela e tocando nessa urna. No treinamento a distância vão ter que ser desenhos, vídeos, mostrando como é”, acrescenta. Ainda será definido como serão os cursos dos TREs, nos estados, com as restrições de isolamento social.
O TSE também afirma que é capaz de realizar as eleições no início de outubro sem novas urnas eletrônicas. Atualmente, o TSE conta com 473 mil máquinas para usar nas eleições deste ano.
Desde o ano passado, há um impasse na aquisição de urnas que substituiriam os equipamentos usados nas eleições de 2006 e 2008, que estão obsoletos. O edital de licitação previa a compra de até 180 mil urnas.
Uma guerra de recursos entre as empresas que concorrem à licitação, associada aos problemas oriundos da pandemia, têm feito o tribunal descartar a utilização das novas urnas. A falta dessas máquinas, porém, tem gerado preocupação desde o ano passado sobre a possibilidade de aumento de filas e aglomerações.
O GT entende que o número de máquinas atuais não prejudica a realização das votações.
“Tem-se por viável a realização das eleições com o parque atual de urnas eletrônicas”, dizia o primeiro relatório do grupo de trabalho da pandemia, de 20 de abril. “Independentemente da conclusão pela viabilidade, tratativas para aprimorar a equalização do parque de urnas permanecem em curso.”
Questionado na quinta-feira (29) se ainda há possibilidade de utilização de novas urnas neste ano, o diretor-geral do TSE, Anderson Vidal, afirma que “todo o nosso cálculo já é descartando a utilização dessas urnas”.
“Desde o ano passado a administração tem informado e trabalhado para a realização das eleições de 2020 sem contar com a aquisição dessas urnas”, diz Vidal. “O parque atual das urnas eletrônicas para fazer essas eleições são de 473 mil urnas. Estamos trabalhando com 473 mil urnas para fazer as eleições.”
Além de Waterloo, Giuseppe, Thayanne e Anderson Vital também fazem parte do grupo de trabalho que avalia os impactos da pandemia. Outros três integrantes compõem a equipe. Nas reuniões, também participam os chefes das assessorias de gestão estratégica, de exame de contas e da comunicação.