Seja no campo jurídico ou político, o que o STF julgará nesta quarta será bem mais que o habeas corpus de um ex-Presidente. Como já adiantou o ministro Gilmar Mendes, que retorna hoje à noite de Lisboa para participar da sessão, o julgamento do remédio constitucional em favor de Lula balizará o entendimento da prisão após condenação em segunda instância. No campo político, a decisão do Supremo terá forte poder decisório nas eleições de outubro – pois, na prática, determinará se Lula participará ativamente ou não das campanhas. Com a corte dividida, o fiel da balança será a enigmática ministra Rosa Weber, que nas vésperas do dia decisivo, afirmou ainda não ter terminado seu voto.
Se desconsiderássemos o voto da ministra gaúcha, teríamos um provável empate entre os demais membros. Enquanto Gilmar Mendes encabeça o grupo de ministros que votaria a favor do concedimento do habeas corpus, Edson Fachin, relator do processo, integraria o grupo de ministros que votaria contra. Alexandre de Moraes, apesar de ter se pronunciado a favor da admissão da medida, no último dia 22, acompanharia o relator, votando contra a medida desta vez. Como a presidente do tribunal tem seu voto praticamente declarado (contra Lula) o voto de minerva ficará mesmo nas costas da ministra Rosa. E a pressão sobre ela tem sido enorme.
Sérgio Moro, que atuou como juiz auxiliar de Rosa Weber no caso do “mensalão”, fez uma referência à ministra em sua entrevista ao programa Roda Viva, que mais pareceu uma pressão pública para que o voto dela acompanhasse o teor de sua sentença contra Lula. “ Tenho apreço especial pela ministra Rosa Weber, com quem trabalhei. Pude observar a seriedade da ministra, a qualidade técnica da ministra”, disse o juiz, antes de declarar que possui expectativa de que o atual entendimento sobre prisão em segunda instância não seja alterado (e consequentemente a prisão de Lula passe a ser possível imediatamente). Moro não foi o único agente público a pressionar o Supremo para este entendimento: houve passeata de juízes agendada nas redes sociais e até procurador anunciando jejum para que a decisão não contrariasse suas expectativas cristãs.
Em 2016, quando foi firmado o atual entendimento do STF sobre prisão após condenação em segunda instância, a ministra votou contra essa possibilidade, ficando, no entanto, vencida na decisão por 6×5 que autorizou – mas não obrigou – os juízes de instâncias inferiores a decretar prisão nessas situações. No julgamento seguinte, realizado de forma eletrônica, e que estendeu o alcance da decisão, Rosa não votou.
Mesmo tendo se manifestado contra a prisão antes do trânsito em julgado, por ter ficado vencida, a ministra tem respeitado a decisão do pleno e recusado sistematicamente habeas corpus de sua relatoria com argumentos semelhantes aos de Lula. Já foram 58 negativas em um período de pouco mais de dois anos. Não foi realizada nenhuma concessão.
Se a decisão do STF ainda não decidirá se Lula poderá ser ou não candidato (isso será decidido pelo TSE, que, coincidentemente, será presidido pela própria ministra Rosa à época do julgamento da candidatura), a decisão de amanhã decidirá se ele será silenciado pela prisão induzida por lawfare ou se estará livre para atuar na campanha, em princípio como candidato, ou, na pior das hipóteses, como cabo eleitoral. Na primeira situação, ele ganha com folga, provavelmente em primeiro turno; na segunda, coloca qualquer candidato no segundo turno com grandes chances de vitória. A prisão de Lula tem sido encarada pela direita como sua principal chance de vitória dentro do campo democrático.
Rosa Weber é Ministra do STF desde 2011, quando foi indicada pela então presidente da República Dilma Rousseff. Desde então, a reservada ministra, de voz baixa e calma, e que evita entrevistas e aparições pública, proferiu algumas sentenças polêmicas como quando utilizou a teoria do domínio do fato para condenar José Dirceu – “a literatura me permite”, disse a ministra na ocasião. Hoje, novamente, será ela a protagonista e poderemos ver se ela pode aguentar as pressões e induções que tem sofrido.
*Por Guilherme Coutinho, jornalista, publicitário e especialista em Direito Público. Autor do blog Nitroglicerina Política