O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes disse que, desde sua criação, há quase 24 anos, o Ministério da Defesa deveria ter sido comandado por um civil, e não por militares. A pasta nasceu em junho de 1999, no governo de Fernando Henrique Cardoso, e substituiu os antigos ministérios do Exército, da Marinha e da Aeronáutica.
O modelo idealizado à época era para que o ministro da Defesa e os comandantes militares formassem um conselho, com o objetivo de tomar decisões relativas à defesa e à segurança do País, em sintonia com o presidente da República.
”Há uma reforma elementar, que talvez nós, do governo Fernando Henrique, deixamos de fazer, que era dizer que Ministério da Defesa tem que ser civil, e não militar. Militar não deve exercer essa função”, afirmou Gilmar, em recente entrevista ao Estadão/Broadcast. Ele foi advogado-geral da União no segundo mandato do presidente Fernando Henrique. Atualmente, o Ministério da Defesa é comandado por José Múcio Monteiro, um político experiente. No governo de Jair Bolsonaro, porém, o cargo ficou sob o comando de militares.
Uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que está no Senado proíbe a candidatura de militares da ativa a cargos eletivos. Mas, como mostrou o Estadão, generais incomodados com o desgaste das Forças Armadas subiram o tom contra a PEC no momento em que avançam as investigações da Polícia Federal sobre a participação de Bolsonaro na tentativa de um golpe de Estado.
Para o senador Hamilton Mourão (Republicanos-RS), ex-vice-presidente da República, a proposta transforma oficiais das Forças Armadas em cidadãos de ”segunda categoria” e, por isso, não deve passar. Na avaliação de Gilmar, porém, os militares precisam de uma “quarentena” para disputar cargos públicos. O magistrado também defendeu uma análise sobre a permanência de militares em postos de livre nomeação, como ministros de Estado.
”Nós vimos que desastre foi, para ficarmos só nesse caso, o general Pazuello (Eduardo Pazuello, hoje deputado federal pelo PL) no Ministério da Saúde”, disse Gilmar. ”Não era só um ser servil ao presidente Bolsonaro. Entregar a essa pessoa a saúde do país, veja as consequências…”
O decano do STF lembrou que houve 700 mil mortes no País por Covid-19. “Então, tudo isso precisa ser examinado. Que cargos eles (militares) devem exercer? Se querem fazer politica, tem que ter um tempo, uma quarentena. Depois sai e ponto. Não volta. São reformas simples, mas necessárias”, destacou o ministro.
A reforma, segundo Gilmar, deveria partir dos próprios militares “para tirar esse constrangimento que paira sobre as Forças Armadas como um todo”. O ministro disse não ter dúvidas de que, após a conclusão das investigações do Supremo e da Polícia Federal, os militares que atentaram contra a democracia serão punidos.
”Só não houve maiores tumultos porque a maioria do Alto Comando não concordou com essa aventura”, argumentou Gilmar.
*por Heitor Mazzoco, Estadão Conteúdo