”Médico me falou o sexo do bebê”, afirma vítima de estupro que teve aborto negado em hospital de SP

Uma vítima de estupro que teve aborto legal negado em hospitais da cidade de São Paulo disse que um dos médicos que a atendeu a forçou a saber o sexo do bebê, apesar de ela não ter dado consentimento. A declaração foi dada em entrevista à GloboNews.

Mulher procurou hospitais da capital para realizar aborto após descobrir que estava grávida em decorrência de um estupro. Ela buscou o procedimento com 26 semanas de gestação, mas quatro hospitais de São Paulo se recusaram a fazer o aborto.

No Brasil, o aborto não é crime em três casos: gravidez decorrente de estupro, risco de morte da mãe e feto anencefálico. Não há limite de idade gestacional.

Além das sucessivas negativas, em um dos hospitais, um médico revelou o sexo do bebê, apesar dos pedidos da mulher para não saber. “Ele (médico) me perguntou se eu queria saber o sexo do neném. Mesmo ele sabendo que era de violência sexual, ele falou: ‘mas você não quer saber? Assim você já vê um nome, caso você não consiga (fazer o aborto)’. E eu falei: ‘não, não quero saber.’ E mesmo assim, ele falou [o sexo]. Foi muito difícil”, declarou a vítima à GloboNews.

O episódio aconteceu na terça-feira (25), no Hospital Municipal do Campo Limpo, na zona sul da cidade. Ainda segundo a vítima, ela buscou outro hospital para que pudesse realizar o procedimento, mas ouviu dos funcionários que “não tem nenhum” na cidade que faça aborto em vítimas de violência sexual.

TJ-SP determinou que a prefeitura realize o procedimento abortivo. Na quinta-feira (27), o Tribunal de Justiça de São Paulo expediu ordem para que a gestão municipal indique o local e a data para que a mulher possa ser submetida ao aborto legal.

Multa em caso de descumprimento. A Justiça também estipulou o pagamento de multa diária de R$ 50 mil caso a prefeitura não cumpra a determinação. A informação foi divulgada pela GloboNews e confirmada pela reportagem.

Aborto é legalizado no Brasil em caso de estupro. A legislação brasileira determina que a mulher violentada sexualmente pode recorrer ao aborto legal em qualquer período da gestação. Recentemente, a Câmara dos Deputados quis aprovar lei para punir a mulher estuprada que abortasse após 22 semanas, mas o projeto está parado após a repercussão negativa.

A reportagem tentou contato com a Secretaria Municipal de Saúde de São Paulo para saber se a decisão do TJSP foi cumprida, mas não obteve retorno. O espaço segue aberto para manifestação.

HOSPITAIS SE NEGARAM A FAZER O ABORTO

Hospitais da rede pública da capital paulista se negaram a fazer o aborto garantido por lei a uma vítima de estupro. A primeira recusa aconteceu no dia 14 de junho, no Hospital da Mulher, considerado referência em atendimento a vítimas de violência sexual. Na ocasião, os profissionais informaram que a mulher estava grávida havia 24 semanas.

Em 18 de junho, ela tentou fazer o procedimento no Hospital Municipal Tide Setúbal, na zona leste, mas foi negado. A mulher recorreu ao Hospital Municipal do Tatuapé, também na zona leste, e foi informada que não havia profissionais para realizar o procedimento.

No dia 20 de junho, a Defensoria Pública de São Paulo recomendou que o aborto fosse feito no Hospital do Campo Limpo, mas a unidade se recusou. À GloboNews, a mulher contou que uma psicóloga da unidade chegou a recomendar que ela fizesse pré-natal.

“Foi muito frustrante, eu saí de lá chorando. Eu só estou querendo uma coisa que eu tenho direito por lei, eu não quero nada mais do que isso. O que passei, eu não quero que outra pessoa passe também não quero que outra pessoa escute isso. Porque já é um caminho muito, muito difícil de ser percorrido. Então eu queria ser acolhida, só isso é muito difícil”, declarou a vítima.

A assistolia fetal é recomendada pela OMS (Organização Mundial da Saúde) e protocolos internacionais em interrupções de gravidezes superiores a 20 semanas. Consiste na injeção de produtos químicos no feto dentro do útero, para evitar que ele seja expulso com sinais vitais, prevenindo desgaste emocional dos pacientes e dos médicos.

Nesta semana, a Prefeitura de São Paulo enviou um ofício ao STF dizendo que aconteceram 68 abortos legais na cidade entre janeiro e junho. Desses, 4 aconteceram após as 22 semanas de gestação.

Moraes considerou a resposta insuficiente. O ministro deu mais 48 horas para que a prefeitura explique se negou a realização de abortos dentro dos casos previstos em lei. Até o momento, a gestão do prefeito Ricardo Nunes (MDB) ainda não respondeu.