”É um impulso natural de civilidade. Em alguns momentos da vida, me dediquei a aspectos dessa dimensão civil, no debate de ideias e ideologias. A gente precisa sempre estar mais contributivo”, afirmou o cantor e compositor Gilberto Gil, de 79 anos, na cerimônia de posse da cadeira número 20 da Academia Brasileira de Letras, a ABL, na noite desta sexta-feira (8).
O novo imortal foi recebido pelo acadêmico Antonio Carlos Secchin. Já a aposição do colar foi realizada pela atriz Fernanda Montenegro, que ingressou, há duas semanas, no Petit Trianon.
Gil começou o discurso ressaltando que é o primeiro representante da música popular brasileira na ABL. ”E aqui é um momento especial, porque a ABL é a casa de Machado de Assis, escritor universal e afrodescendente como eu” disse. ”Poucas vezes artistas, produtores culturais foram hostilizados como agora. Há um movimento em prol da desrazão nas redes sociais e a ABL pode contribuir para esse debate civilizatório.”
E prosseguiu: ”O que será do Brasil em meio a esse mundo de pandemias e guerras? O que os políticos estão fazendo para acabar com a fome e o analfabetismo? Quando vamos alcançar a independência tecnológica e científica? Até quando seremos o país do futuro de [Stefan] Zweig? Apesar dos tempos politicamente sombrios em que vivemos, aposto na esperança”.
Em novembro do ano passado, Gil havia sido eleito, após receber 21 votos na disputa com o poeta Salgado Maranhão (sete votos) e o escritor Ricardo Daunt (nenhum voto). Ministro da Cultura de 2003 a 2008, ele ocupará a vaga deixada pelo jornalista Murilo Melo Filho, morto em maio de 2020.
O poeta, filósofo e acadêmico Antonio Cicero, autor de sucessos da MPB, como “Virgem”, comentou a posse de um representante da música popular na ABL.
”Espero que essa polêmica entre letra de música e poesia tenda a terminar. Eu estou confiante, porque é uma tendência moderna. Ao mesmo tempo, é um reconhecimento da antiguidade, quando os poemas eram cantados. A tendência é que o debate sobre o que é literatura se aprofunde.”
Expoente da Tropicália nos anos 1960, movimento que revolucionou a música brasileira, a eleição de Gil simboliza o fortalecimento da representatividade negra entre os acadêmicos, indicando mais uma etapa do processo de modernização da ABL –iniciada com a posse de Fernanda Montenegro, ”uma mulher do palco”, como se definiu em seu próprio discurso.
Autor de discos fundamentais para a história da MPB –”Gilberto Gil” (1969), ”Expresso 2222” (1972) e ”Refazenda” (1977)–, Gil teve o conjunto de seus poemas reunido no livro “Todas as Letras”, editado em 1996, com organização de Carlos Rennó.
A cadeira nº 20 tem como patrono Joaquim Manoel de Macedo e fundador Salvador de Mendonça. Antes de Gil, ocuparam a vaga Emílio de Meneses, Humberto de Campos, Múcio Leão e Aurélio de Lyra Tavares –ministro do Exército e um dos signatários do AI-5, em 1968, que vitimou o próprio Gil. Informações do site Bahia Notícia