Uma ex-assessora do senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro admitiu ao Ministério Público ter devolvido a maior parte de seu salário para o policial militar aposentado Fabrício Queiroz, apontado como operador do esquema da ”rachadinha” comandado pelo filho do presidente Jair Bolsonaro.
Luiza Souza Paes foi a primeira ex-funcionária do senador a confirmar o esquema descrito pela Promotoria e dar detalhes sobre sua operação. O depoimento da ex-assessora foi revelado pelo jornal O Globo e confirmado pela Folha. Ele faz parte da denúncia oferecida nesta terça-feira (3) contra o senador por liderar uma organização criminosa para a prática de peculato, lavagem de dinheiro e apropriação indébita.
Além dele e Queiroz, outras 15 pessoas foram denunciadas. Luiza prestou depoimento em setembro ao MP-RJ. Ela disse que repassou cerca de R$ 160 mil a Queiroz por meio de depósitos e entrega de dinheiro em espécie. O MP-RJ já havia identificado R$ 155,7 mil em repasses dela ao PM aposentado.
A ex-assessora ficou apenas um ano nomeada no gabinete de Flávio, mas depois ocupou cargos na estrutura da Assembleia, como a TV Alerj e o Departamento de Planos e Orçamento.
O valor representa cerca de 90% do que ela recebeu. Ela só ficava com R$ 700 mensais, segundo relatou ao MP-RJ. De acordo com o depoimento, ela devolvia não apenas seu salário líquido, mas também benefícios pagos pela Assembleia e até a restituição do imposto de renda.
Ela diz que só soube do esquema no dia em que foi de fato nomeada para o cargo, em agosto de 2011. Luiza afirmou que foi empregada no gabinete quando concluía o curso de Estatística. Ela havia pedido a Queiroz, amigo de seu pai, um estágio.
Amigo do presidente há mais de 30 anos, Queiroz é apontado como o responsável pelo recolhimento dos salários de funcionário do antigo gabinete de Flávio e pagamento de despesas pessoais do senador com o dinheiro proveniente da ”rachadinha”. Preso preventivamente em 18 de junho, o PM aposentado cumpre a medida cautelar em regime domiciliar graças a liminar do ministro Gilmar Mendes, do STF.
Queiroz foi o pivô da investigação iniciada em janeiro de 2018 contra Flávio. Naquele mês, o MP-RJ recebeu um relatório do Coaf apontando a movimentação atípica de R$ 1,2 milhão entre janeiro de 2016 e janeiro de 2017.
Além do volume movimentado, chamou a atenção a forma com que as operações se davam: depósitos e saques em dinheiro vivo em datas próximas do pagamento de servidores da Assembleia.
A investigação, conduzida pelo Gaecc a partir de fevereiro de 2019, apontou que Queiroz recebia depósitos de ao menos 13 ex-assessores de Flávio e sacava os recursos logo em seguida. A Promotoria identificou depósitos de R$ 2 milhões de 2007 a 2018, período em que o PM aposentado esteve empregado no gabinete de Flávio.
No mesmo intervalo, Queiroz fez saques que somam R$ 2,9 milhões, o que levantou a suspeita entre promotores de que outros funcionários do gabinete não identificados também realizavam transferências ao operador. Investigadores também indicam a possibilidade de entrega em dinheiro vivo direto a Queiroz, para evitar o registro dos repasses em instituições bancárias.
As medidas cautelares obtidas pelo Ministério Público também mostraram que, de 2007 a 2018, ex-assessores de Flávio na Assembleia do Rio sacaram mais de R$ 7 milhões de suas contas. Em alguns casos, os saques representaram 99% dos respectivos salários. O Gaecc afirma haver indícios de que toda essa arrecadação teve como destino gastos pessoais do filho do presidente.
Os promotores apontam que o pagamento de escolas dos filhos e o plano de saúde da família do senador foram pagos, na maioria das vezes, com dinheiro vivo –somando mais de R$ 280 mil de 2013 a 2018.
A investigação, contudo, indicou dois modelos de lavagem de dinheiro com valores mais volumosos. O MP-RJ apontou indícios de que o senador utilizou a loja de chocolates de que era sócio para lavar até R$ 1,6 milhões por meio de depósitos em dinheiro vivo.
Segundo a apuração da Promotoria, o volume de pagamentos recebidos pela empresa com recursos em espécie é acima da média praticada neste mercado. Outro meio de lavagem de dinheiro apontado pelo MP-RJ foi a compra e venda de dois apartamentos entre 2012 e 2014. Da Folha de S.Paulo