Ao ter a ideia de criar uma revista literária, a professora de língua portuguesa Bárbara Carneiro não imaginava como aquele produto mudaria a vida dos estudantes do Colégio Estadual Professor Carlos Valadares (CEPCV), do município de Santa Bárbara. ”Em uma roda de conversa, algumas alunas relataram que encontraram na escrita a cura para algumas questões emocionais e psicológicas, como ansiedade e síndrome do pânico. Elas puderam colocar no papel as angústias da alma. A partir daquele momento, percebemos como escrever também se tornou um processo terapêutico”, destacou a professora.
Foi o que aconteceu com a estudante Joana Anjos, de 18 anos. ”Percebi que, ao transferir os meus sentimentos para o papel, as minhas crises de ansiedade foram amenizadas. Passei a me sentir mais tranquila. Ainda me descobri como uma ótima repórter. É muito gratificante ver uma iniciativa como essa, que começou tão pequena, tenha hoje toda essa visibilidade”.
A expansão, relatada por Joana, se refere à nova iniciativa do Instituto Anísio Teixeira (IAT), órgão vinculado à Secretaria da Educação (SEC), em implantar o projeto Agências de Notícias na Escola na rede estadual de ensino, como forma de criar um ambiente de protagonismo e aprendizagem ativa para os estudantes e conscientizá-los sobre o consumo consciente de conteúdos. Já são 81 agências espalhadas pelos 27 territórios de identidade da Bahia, e investimentos que somam R$ 1,5 milhão, em equipamentos e materiais diversos.
“Com as agências, além de trabalhar pedagogicamente conteúdos de língua portuguesa, história, geografia, vamos focar também na formação crítica desses jovens, para que eles saibam identificar o que é uma notícia falsa, como a informação deve ser produzida e o poder da apuração”, pontuou a diretora de inovação e tecnologia do IAT, Carla Aragão.
A seleção das escolas teve início no ano passado, através de uma convocação geral. As unidades estaduais que demonstraram interesse e já tinham algum trabalho iniciado ou afinidade com o projeto foram selecionadas, como foi o caso da CEPCV. Carla ainda sinalizou que em cada território é realizado um trabalho diferenciado. ”Nas escolas quilombolas, indígenas ou do campo, elaboramos pautas mais voltadas para a identidade e representatividade”. A pretensão da SEC é expandir para os 417 municípios.
No CEPCV, a agência de notícias já é bem completa e os 33 estudantes trabalham com quatro produtos: revista literária, jornal impresso e online (blog e redes sociais), e podcast. Eles se dividem entre as tarefas de escritor, produtor de pauta, repórter, editor, ilustrador, curador, radialista e social media.
A orientadora do jornal impresso CEPCV e professora de língua inglesa, Charlene de Jesus, descreveu como funciona a elaboração das pautas e como os alunos tem se sentido ao fazer parte da agência. ”Eles pensam em um tema, apresentam para os orientadores, criamos um roteiro e decidimos os entrevistados juntos. A partir daí, eles desenvolvem a matéria jornalística, que depois editamos e publicamos. Então, há uma dinâmica muito boa e de envolvimento de todos. Estamos lapidando esses diamantes que temos na escola. É uma mudança educacional bastante significativa para todos aqui”, explicou.
A dinâmica é parecida com a do podcast, que na CEPCV recebeu o nome de ”SertãoCast”. O estudante Tauan Cunha é o responsável pelas entrevistas. ”Entrevisto os convidados após elaborarmos as perguntas em equipe. Então, preciso ser mais solto e engajar a conversa. É um projeto que combina comigo porque gosto muito de conversar e sempre vi muitos podcasts, que acabaram me inspirando. Dependendo da oportunidade, penso em seguir carreira na área”. O podcast, orientado pelo professor de história Yan Allen Silva, está disponível no Instagram, pelo perfil @sertaocastoficial.
Durante um desses bate-papos, Tauan entrevistou o vice-diretor Keivin Darlan e questionou quais foram as principais mudanças percebidas nos alunos após a implantação da agência de notícias. ”Acredito que a entrega seja a maior delas. Eles correm atrás da notícia, estão mais empenhados. Também mudaram a forma de pensar em relação à sociedade e agora tem mais consciência cidadã”.