Após uma batalha judicial, o advogado e professor de Direito, Diego Massena, conseguiu se tornar pai. Solteiro e gay, ele só teria duas opções para realizar o sonho da paternidade: adotar ou fazer uma técnica de reprodução assistida com um útero cedente – decisão escolhida por ele. Em fevereiro de 2021, em Salvador, ele procurou a médica especialista em reprodução assistida, Amanda Cútalo, para iniciar o tratamento e se tornar pai solo.
No dia 29 de setembro, o sonho se tornou realidade, quando nasceram as duas meninas gêmeas, em uma maternidade, no bairro da Federação, em Salvador. Para que isso fosse possível, ele precisava de uma mulher que topasse ceder o útero a gerar as crianças, além de conseguir os óvulos de uma doadora anônima.
O Conselho Federal de Medicina (CFM) determina que a mulher que cede o útero não pode ser a doadora dos óvulos ao mesmo tempo. A prima de Diego Massena topou entrar na jornada de ”corpo, útero e alma”. Entretanto, havia um problema. O CFM, através de uma resolução, recomenda que a mulher que ceder o útero já seja mãe de ao menos um filho vivo, o que não era o caso da prima do advogado.
E como as resoluções do CFM não são leis, mas recomendações, Diego Massena advogou em causa própria e entrou com um pedido para realizar o procedimento junto ao Conselho Regional de Medicina da Bahia (Cremeb), que negou o pedido e informou que decisão de diretoria não precisa ser justificada.
Com isso, foi iniciada uma batalha na Justiça, pois a doação do óvulo tinha um prazo. Ele ingressou com uma ação para autorizar o procedimento, com parecer do Ministério Público. ”O Ministério Público não acreditava que um órgão como o CREMEB dissesse que não ia justificar o motivo do indeferimento. Mas foi o que aconteceu”, relata Diego, que seguia sem saber as razões da negativa.
Após decisão judicial, o Cremeb se manifestou, alegando que o pedido foi negado pois a gestora afirmou ”não ter interesse na maternagem, mas em outro momento ela poderia mudar de opinião”. Além disso, alegou que uma gravidez tem riscos, como a perda do útero. Para Diego, o Cremeb negou o pedido baseado em hipóteses, decidindo sobre o corpo e vontade de uma mulher livre, em um processo acompanhado de relatórios médicos, psicológicos e psiquiátricos afirmando que tanto pai solo quanto a prima do útero cedente estavam certos da atitude.
Ao ler as razões do documento, Diego ficou estarrecido com a situação. ”Ou seja, qualquer mulher, a partir dessa interpretação do Cremeb, não poderia mais engravidar, já que toda gravidez tem riscos. Pior, eles querem decidir até sobre nossa possibilidade de se arrepender. Sinceramente, fiquei sem chão, uma vez que fui informado sobre muitos pedidos de casais heterossexuais prontamente aprovados”, relata o advogado. ”Foi humilhante ler isso e depois eu entendi o porquê eles não queriam apresentar os documentos. Ao chegar no Cremeb eu tremia, tinha medo, porque eles diziam que eu não ia fazer e ponto final”, lembra Diego.
Após meses de espera e quase perder o início de tratamento, finalmente ele conseguiu sentença favorável ao seu procedimento. Só com esse documento em mãos que as portas passaram a se abrir. Com o papel debaixo do braço assinado pela juíza, ele garantiu três direitos: iniciar a fertilização in vitro, garantir que os bebês fossem registrados somente em seu nome e entrar com o pedido de licença maternidade por equiparação de seis meses, semelhante às mulheres.
Após a batalha na Justiça, foi realizada a fertilização in vitro, com óvulo cedido por mulheres que passaram pelo mesmo tratamento e os colocam à disposição para que outras pessoas, como Diego, realizassem o sonho de constituir uma família. ”A doadora é escolhida com base no biotipo da receptora, mas no caso de Diego, pela receptora ser somente a cedente de útero e não a mãe, não foi preciso seguir esta regra. Diego não tinha preferência quanto ao tipo físico da doadora, nem de altura, cor de pele e olhos. Poderia ser qualquer uma. Isso acelerou o processo”, pontua a médica.
A fertilização dos óvulos foi feita com o próprio sêmen do pai solo para gerar o embrião possibilitando que, biologicamente, as filhas tenham 50% do seu DNA. Com os embriões prontos, eles foram transferidos para o útero da prima.
A prima de Diego não quer ter filhos e possui o desejo de ligar as trompas, manifestado algumas vezes durante as consultas médicas. Mesmo assim, teve que passar por diversas avaliações psicológicas. ”Não havia nenhum fator físico ou psicológico que a impedisse de gestar ou de ligar as trompas. A mulher pode e deve decidir sobre o seu corpo, sobre o seu direito de não querer ser mãe. Dizer que ela pode se arrepender dessa decisão é um total desconhecimento sobre direitos reprodutivos femininos”, pontua a médica.
Outra dificuldade foi achar uma médica obstetra que abraçasse a causa naturalmente. ”Tive que testar várias médicas em Salvador, até encontrar uma que olhasse naturalmente para mim sem nenhum preconceito embutido”. No dia 29 de setembro deste ano, Diego Massena se tornou o primeiro soteropolitano pai solo a partir de fertilização in vitro. Para o registro das crianças após o nascimento, o pai enfrentou outras batalhas para que a certidão constasse que ele é o pai. Para isso, ele precisou de mais relatórios médicos que comprovem que se trata de um pai solo. Passada essas batalhas, agora, o advogado e professor têm relatado nas redes sociais a experiência da paternidade. Com informações do site Bahia Notícias