Um dos maiores destinos do ecoturismo brasileiro está isolado em meio a Chapada Diamantina. ”A gente está numa situação em que estamos ilhados”, é o que relatam os moradores do distrito do Vale do Capão, no município de Palmeiras, a 446 km de Salvador. O problema é consequência da interrupção da obra de pavimentação da estrada que dá acesso à localidade, após a prefeitura emitir um licenciamento irregular para o início das intervenções.
Em fevereiro deste ano, a Prefeitura de Palmeiras anunciou, em colaboração com o Governo do Estado, a obra de pavimentação asfáltica da estrada de acesso entre a sede do município, em Palmeiras, e o distrito do Capão, um trecho de 19,8 km da BA-849. A moradora e guia turística Patrícia Gomes afirma que a situação na região é de abandono. Segundo ela, o investimento em infraestrutura e acessibilidade na região é precária e fica ainda mais evidente a partir da deterioração deste trecho da BA.
Patrícia explica que viveu momentos de ”sofrimento” em detrimento do mau estado da rodovia. ”A minha irmã se acidentou e quebrou a tíbia e a fíbula, dois ossos da perna. Ela recebeu primeiros socorros mas como a estrada estava muito esburacada e era muito pó, em todo o trecho, o que a gente faria normalmente em 50 minutos, fizemos em 2h30 com ela sentindo dor em cada buraco que passamos. Então foi uma experiência muito sofrida, sendo que numa via de acesso bem feita e cuidada, ela faria esse percurso no fluxo natural”, relata a moradora. O caso aconteceu na última quinta-feira (2).
Segundo ela, não é a primeira vez que situações como essa ocorrem na região. Em detrimento da falta de pavimentação na estrada, motoristas denunciam a dificuldade de tráfego na região. Em vídeo gravado por uma internauta do Bahia Notícias, é possível observar as crateras na via, além da poeira, levantada pelos veículos de maior carga, que impossibilita a visibilidade no trajeto. A guia turística ressalta, no entanto, que este não é o único problema.
‘E essa mesma estrada, agora, hoje é um dia de chuva, essa mesma estrada se tornou um caos de lama. Mais buracos apareceram e tudo aquilo que era pó, virou lama. A gente está numa situação em que estamos ilhados. Numa situação de emergência, isso tudo se mostra com mais gravidade”, declara.
Nas redes sociais, numa publicação feita no dia 1º de fevereiro, a gestão comemorou a liberação da obra. ”O trecho de quase 20km na BA-849, que dá acesso ao distrito de Caeté-Açu, entre a sede de Palmeiras ao Vale do Capão é um sonho antigo e uma demanda tão sonhado pelos nativos e moradores que trafegam diariamente, seja em busca de produtos para abastecimento dos seus estoques, ou por questões de saúde. Essa obra também vai ajudar a desenvolver o turismo e a economia do município, gerando mais emprego e renda de forma direta e indireta.” Todavia, em junho de 2023, o Ministério Público estadual (MP-BA) emitiu uma recomendação para a suspensão da obra com base em irregularidades apontadas a partir de uma denúncia anônima.
Ao Bahia Notícias, o MP afirma que a recomendação foi lançada a partir do descumprimento, por parte do Município, do Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) que reafirma a governança do Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Inema) para a emissão das licenças ambientais. De acordo com o órgão, a autorização que deu início a obra, concedida pela Prefeitura de Palmeiras, era irregular, já que não constava com licença ambiental prévia emitida por órgão estadual. Na recomendação assinada pelo promotor de Justiça Alan Cedraz Carneiro Santiago, em 6 de junho deste ano, o órgão recomenda a Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econômico Sustentável de Palmeiras (Sedesp) ”que, imediatamente, se abstenha de emitir novas autorizações de manejo ou supressão de vegetação inseridas, ainda que parcialmente, em área do bioma Mata Atlântica, resguardando tal competência ao Estado”. Quando procurada pela reportagem, a Sedesp afirmou que ”não tem conhecimento sobre o caso”.
A Secretaria de Infraestrutura da Bahia (Seinfra) informou que a empresa responsável pela obra de pavimentação do trecho de ligação entre Palmeiras e o distrito de Caeté-Açu está aguardando a liberação de licenças ambientais pelo Inema para retomar a execução dos serviços. Segundo o morador local e membro do GECA – Grupo de Estudos e Cidadania do Vale do Capão, Diogo Guimarães, ”a COSAMPA [empresa contratada, a partir de licitação, para a realização da obra] atendeu a solicitação, retirou o maquinário e ficou aguardando o posicionamento, pois ela estava tendo custos com a obra parada aqui”.
”A prefeitura literalmente se omitiu e se calou, até para questionamentos. A gente tem até acesso a algumas sessões na Câmara e vereadores da oposição que dão informações pra gente, mas na prática a prefeitura não passou uma resposta para a população em momento nenhum, nem através de nota”, completa Diogo.
A prefeitura de Palmeiras e o Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Inema) foram procurados pela reportagem. No entanto, não se manifestaram.