O acordo do governo federal com o Senado para impedir a derrubada de parte dos dois decretos que mudam regras do Marco do Saneamento desagradou às empresas municipais do setor, que avaliam ir ao STF (Supremo Tribunal Federal) contra as alterações.
O ponto que desagradou prevê que municípios que prestam diretamente o serviço de saneamento —sem um aval estadual— precisarão ter a atividade prevista em uma lei da respectiva unidade federativa para continuar com a atividade.
”É um absurdo, não vamos aceitar. Todas as medidas estão em cima da mesa. Uma ADI [Ação Direta de Inconstitucionalidade] no STF, o que for possível”, afirmou o secretário-executivo da Assemae (Associação Nacional dos Serviços Municipais de Saneamento).
Hoje, há cerca de 1.700 municípios que operam diretamente o saneamento. Isso significa que alguma entidade ligada à prefeitura é quem presta o serviço. Com a mudança, todas elas precisarão de uma autorização do estado para continuar a atividade.
”Um município como Campinas, que é referência para saneamento no país e opera seu serviço há quase 50 anos com um dos melhores indicadores nacionais, de repente vai ter que submeter a continuidade da sua operação [a uma lei estadual]”, avaliou Manuelito Magalhães, presidente da Sanasa —empresa que opera o saneamento na cidade.
”Isso traz insegurança jurídica do ponto de vista de recursos de financiamento já em curso. É um retrocesso patrocinado pelo governo federal”, acrescentou.
A alteração foi negociada com o Senado porque os parlamentares queriam derrubar totalmente o trecho permitindo a prestação direta por municípios, de acordo com relatos colhidos pela reportagem.
O acordo fechado nesta terça (11) pelo governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) com líderes do Senado em torno de um novo decreto do saneamento evitou que entrasse na pauta do Senado a votação do PDL (Projeto de Decreto Legislativo) que, se aprovado, derrubaria mudanças elaboradas pelo Executivo em abril no Marco do Saneamento —que recebeu aval dos parlamentares em 2020.
A proposta de novo decreto retira a brecha que dispensa licitação para empresas estatais de saneamento, como antecipou a Folha de S.Paulo. Esse era um dos pontos mais polêmicos dos atos publicados pelo presidente Lula (PT) e que foram questionados pelo Congresso.
Em maio, o plenário da Câmara aprovou a derrubada de trechos dos decretos presidenciais. A maioria dos deputados votou para sustar a brecha para que companhias estaduais prestem serviços sem licitação, o afrouxamento nas regras para que estatais comprovem capacidade técnica e financeira e a possibilidade de empresas regularizarem contratos precários.
A principal crítica de parlamentares em relação aos decretos de Lula era que o presidente usou o texto para criar novas regras, que deveriam ser aprovadas no Congresso. Portanto, os decretos não teriam apenas regulamentado o setor de saneamento.
O Palácio do Planalto e o Ministério das Cidades fecharam um texto na véspera do encontro com senadores. Lula se reuniu com Padilha e com o líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA), na tarde desta segunda-feira (10) para dar aval à negociação.
O Marco do Saneamento definiu para 2033 a meta de chegar à chamada universalização do serviço —no caso, fornecer água para 99% da população e coleta e tratamento de esgoto para 90%.