Nessa guerra contra o terrível coronavírus, que caminha para enlutar 400 mil lares brasileiros, não há o que comemorar. É uma guerra onde só contamos cadáveres, choramos pela perda de parentes e amigos queridos, pelo vazio que deixam sem o direito sequer de uma despedida digna.
Mas se precisamos de um estímulo para seguirmos nessa dura batalha há, em meio a tantos números desanimadores, um do qual podemos nos orgulhar: o Nordeste é a região do país com menor número de óbitos por 100 mil habitantes, puxando para baixo a média nacional.
Assim, nesse trágico 2021, de recordes e mais recordes negativos, o sofrido Nordeste dá um exemplo ao Brasil, através seus governantes e seu povo, cumprindo à risca o que manda a ciência para enfrentar esse vírus, ao menos enquanto a vacina não chega para todos.
Esse ano, a taxa de mortalidade na região está em 49 por 100 mil habitantes, 37% menor do que a média nacional no mesmo período, que chega a 78 por 100 mil habitantes. E menos que a metade na rica região Sul, líder no índice, onde o número chega a 109 por 100 mil.
E o que explica esses números…
Vale voltar no tempo para entender melhor. Em março de 2020, quando a pandemia começou a se alastrar no país, o Nordeste lançou um comitê científico para ajudar os governos a tomarem medidas de prevenção contra a covid-19.
Lançaram campanhas em massa alertando sobre a necessidade de distanciamento, uso de máscara e álcool em gel. O governador Rui Costa foi um dos guerreiros nessa batalha, mesmo enfrentando a indiferença e o descaso com a pandemia por algumas autoridades federais. A região também foi a primeira a ter uma metrópole a realizar um lockdown – no caso, São Luís.
Um orgulho partilhado por todos os estados da região mais pobre do país, de menor nível cultural em sua imensa zona rural, mas que foi levada pelos seus governantes a seguir o que recomenda a ciência. “O Nordeste hoje é quem puxa a mortalidade do Brasil para baixo”, diz André Longo, secretário de Saúde de Pernambuco e vice-presidente do Nordeste do Conass (Conselho Nacional de Secretários de Saúde).
Mas a Bahia escreve um capítulo à parte nessa batalha. Aqui, governador e prefeitos, em especial da capital, deram as mãos deixando de lado divergências políticas, e os secretários de saúde, Fábio Vilas Boas, do Estado, e Léo Prates, do Município, se tornaram mais que parceiros.
E os resultados estão aí. Enquanto o Brasil contabiliza uma média nacional de 174 óbitos por 100 mil habitantes, a Bahia contabiliza 114 mortes por cada 100 mil baianos, segunda menor média do Brasil, menor inclusive que a do Nordeste que cravou 134 vidas perdidas por 100 mil habitantes, neste até este fim de semana. Em números gerais, segundo os dados oficiais do Ministério da Saúde, a região registrou até a sexta-feira 76 mil dos 365 mil óbitos – o equivalente a 21%.
Não há o que comemorar, até porque com suas carências por demais sabidas o Nordeste vem fazendo mais do que pode, mas sem a menor dúvida os méritos pela heroica resistência empreendida até aqui pela região devem ser partilhados pelos governadores, prefeitos, secretários de saúde e, acima de tudo, os profissionais de saúde, a grande maioria trabalhando sem férias e até folgas, para ajudar a salvar vidas.
Mas a Bahia e Salvador, como referência, seguem no topo de todas as avaliações. Praticamente já não há fila para regulação por um leito de UTI, o serviço público de saúde foi considerado modelo em termos de atendimento e cumprimento do que recomenda a ciência, com destaque para o isolamento social, com fechamento do comércio e outras atividades durante todo o mês de março, procedimento que virou referência no país citado como iniciativa bem-sucedida, ressaltada no último boletim da Fiocruz.
Um reconhecimento que transpôs fronteiras e hoje vem de longe. A revista científica The Lancet, considerada referência no segmento no mundo na área médica, uma espécie de bíblia nesses tempos de pandemia e busca por vacinas e procedimentos, afirmou que o Nordeste é o melhor exemplo de medidas restritivas com sucesso no país, mesmo sendo uma área com grande vulnerabilidade social.
*Paulo Roberto Sampaio é diretor de Redação da Tribuna