Pego de surpresa por medida de Donald Trump, Governo Bolsonaro não planeja retaliações

Bolsonaro não planeja retaliações a Trump. Foto: Reprodução

O tuíte de Donald Trump anunciando a retomada das tarifas sobre o aço e alumínio do Brasil e da Argentina caiu como uma bomba no governo brasileiro. O Planalto e o Itamaraty foram pegos de surpresa, e preparam agora argumentos para provar ao presidente americano que a desvalorização do real não é proposital.

A estratégia é fazer contatos com autoridades americanas e tentar reverter a medida de forma discreta. No momento, o governo brasileiro não planeja impor tarifas retaliatórias.

A grande maioria dos países que foram alvejados na guerra comercial de Trump retaliaram.

União Europeia, China, Turquia, Rússia e Índia, além de Canadá e México, que têm acordo comercial com o vizinho, impuseram tarifas contra produtos dos Estados Unidos em retaliação às sobretaxas impostas pelo governo Trump. Alguns no governo argumentam que o tuíte de Trump ainda pode ser revertido, uma vez que a medida ainda não foi oficializada pelo USTr (Escritório de Comércio dos EUA).

Para Trump, a medida tem um claro contexto eleitoral. A guerra comercial contra a China vem causando prejuízos a agricultores de estados que serão essenciais na eleição de 2020. As exportações agrícolas dos EUA para a China em 2017, antes de iniciar a guerra comercial, foram de US$ 21,8 bilhões (ano fiscal).

Trump iniciou a guerra comercial ao impor tarifas sobre produtos chineses em julho de 2018. No ano fiscal de 2018, vendas de produtos agrícolas americanos para os chineses já caíram para US$ 16,2 bilhões e no ano fiscal de 2019, segundo o Departamento de Agricultura dos EUA, ficaram em US$ 10 bilhões.

A China passou a comprar muitos desses produtos agrícolas do Brasil e da Argentina, além de intensificar os investimentos da Iniciativa Cinturão e Rota, de obras de infraestrutura em vários países fornecedores de produtos agrícolas.

De quebra, Trump ainda faz um aceno ao chamado Cinturão da Ferrugem, estados como Michigan, Ohio, Pensilvânia, que têm concentração de siderúrgicas e sofrem com a concorrência chinesa— e também são estados-pêndulo, que decidem eleições. “Precisamos que nossos aliados e amigos também sigam as regras do jogo”, afirmou Kellyanne Conway, estrategista de Trump, justificando a imposição de tarifas sobre o Brasil e a Argentina.

Para a política externa de Bolsonaro, a medida é um duro golpe.

O país abriu mão do tratamento especial e diferenciado na OMC (Organização Mundial do Comércio) a pedido dos Estados Unidos, que querem modificar o mecanismo para não dar uma vantagem injusta à China em negociações comerciais.

Em troca, Trump anunciou apoio às ambições brasileiras de iniciar o processo de entrada na OCDE, o clube dos ricos. O governo de Bolsonaro vê a entrada no órgão como um selo de qualidade de políticas macroeconômicas.

Até agora, esse apoio não se concretizou.

Em agosto, em carta à organização, Washington reiterou o apoio às candidaturas de Argentina e Romênia na OCDE, mas se opôs a uma ampliação maior no número de membros do órgão, o que, na prática, solapa as ambições brasileiras. O Brasil ampliou e renovou neste ano cotas sem tarifa para importação de etanol e trigo, reivindicações americanas.

Mas os EUA não removeram as barreiras sanitárias que impedem a importação de carne bovina in natura nem anunciaram modificações na proteção do açúcar americano, outro pedido brasileiro.

Por fim, o Brasil cedeu às pressões dos EUA e votou pela primeira vez em 27 anos contra a resolução anual da ONU que condena o embargo econômico americano a Cuba.

Apenas Israel e Estados Unidos votaram da mesma maneira que o Brasil.

O máximo de sinalização positiva que o governo Trump deu a Bolsonaro foi o início da fase de testes para participar do Global Entry, programa que facilita a entrada de viajantes frequentes e pré-aprovados aos EUA, mas não os isenta de visto.

Os testes vão permitir identificar quais são as necessidades técnicas e operacionais para o lançamento de uma fase piloto e, só então, a execução plena e ampliada do programa.

Vários países da América Latina, como Argentina, México, Colômbia, Panamá, já fazem parte do Global Entry há tempos.

*Folhapress