Só pode ser vista como tática de pressão política sobre o Tribunal do Santo Ofício de Curitiba (forma apropriada como o bravo jornalista Mino Carta se refere aos justiceiros do Paraná) a proposta de alguns dirigentes do PT de boicotar as eleições de 2018, caso Lula seja alijado da disputa. A ideia seria dar desdobramentos práticos e radicalizados à palavra de ordem “eleição sem Lula é fraude.”
Alguns petistas pregam inclusive o alargamento do boicote, com o partido se negando a lançar candidatos à Câmara dos Deputados e ao Senado. E, seja por coerência ou efeito cascata, o PT também abdicaria de disputar os governos estaduais e as vagas nas assembleias legislativas. A meu ver, tudo da boca para fora. Não pode ser levada a sério a entrega de mão beijada não só da presidência da República e governos aos carrascos do povo, mas também de todas as cadeiras dos parlamentos.
Já imaginou no que se transformaria o Brasil caso o maior partido de esquerda abandonasse a institucionalidade? A julgar pelo ódio que a elite sente pelo nosso povo, estaríamos a um passo da volta do regime escravocrata. Teríamos a consolidação definitiva da roubalheira do dinheiro público e todas as riquezas nacionais seriam dilapidadas a céu aberto, de forma bem mais escancarada do que já ocorre no governo golpista de Temer. Nesse cenário a repressão aos movimentos sociais e a caçada às vozes da imprensa alternativa são mais do que previsíveis. A ditadura judicial-parlamentar fincaria raízes.
Embora de sinal trocado, lembro de um boicote semelhante. Ele ocorreu em uma das eleições venezuelanas ocorridas em passado recente, quando a oposição ao então presidente Hugo Chávez decidiu não lançar candidatos em protesto contra o avanço da revolução bolivariana. O resultado se revelou trágico para as forças de oposição, pois os chavistas ficaram à vontade para implementar seu programa de forma acelerada. A direita da Venezuela, que hoje optou pelo golpismo, pela sabotagem e por ações de terror faz profunda autocrítica da não participação nesse pleito.
Lula é o elemento central da sucessão, sendo ou não candidato. E o PT deve seguir apostando nas caravanas, fator de acúmulo de força política e espaço privilegiado para a denúncia da caçada sofrida pelo maior líder popular do país por parte da ditadura judicial-midiática. Esses périplos pelas entranhas da Brasil têm o condão de fazer Lula retomar a iniciativa política e acuar seus adversários. Sem falar que é um campo no qual ele não tem concorrentes nem aqui nem em qualquer lugar do planeta.
Até que o TRF-4 julgue o recurso da defesa do ex-presidente, provavelmente até julho de 2018, Lula deve assumir de forma cada vez mais ostensiva sua condição de candidato. E, não é verdade que uma eventual e provável condenação em 2ª instância, no jogo sujo de cartas marcadas armado para impedi-lo de ser candidato, signifique sua automática exclusão da eleição presidencial. Ainda restariam possibilidades de recursos ao STJ e ao STF. Em 2014, nada menos que 28 candidatos concorreram amparados por liminares concedidas por tribunais superiores.
Se tudo der errado, sobra ainda o caminho da resistência popular, da insubordinação e da desobediência civil. Contudo, como lembrou o professor Aldo Fornazieri em artigo publicado dias atrás, isso não acontecerá espontaneamente a partir da revolta das dezenas de milhões de pessoas que vêm em Lula sua única esperança. Ou o PT dirige e organiza a luta, ou ela se limitará a duas ou três manifestações sem consequência.
Ao fim e ao cabo de tudo isso, se a inabilitação de Lula se consumar, ele deve atuar na campanha com agenda de candidato, pedindo voto para o candidato do PT em todos os comícios, viajando por todo o país e ocupando espaço privilegiado na propaganda de rádio e televisão, tal qual um candidato não candidato. Sua eventual prisão, hipótese que considero remota, pode gerar uma comoção de consequências imprevisíveis. Mesmo encarcerado, Lula não perderá a condição de maior cabo eleitoral do país.
Como se vê não faz sentido o partido mergulhar agora no debate sobre um plano B para o caso de Lula não poder concorrer.Primeiro porque ainda há muita lenha para queimar. E depois porque até as cinco pontas da estrela do partido sabem que a vaga está entre Fernando Haddad e Jaques Vagner. Que tal os dois se transformarem desde já em companhias fixas de Lula nas andanças pelo país?
PS : A pesquisa da CNT divulgada nesta terça-feira (19/9) mostra que Lula é um fenômeno a ser estudado por muitos anos no futuro. Que outro político do Brasil e do mundo, hoje ou no passado, seria capaz de sobreviver ao massacre que ele sofre ? Depois que Palocci decidiu fazer o jogo do inimigo, diversos colunistas da mídia monopolista cravaram pela milésima vez a morte política de Lula. De novo deram com os burros n’água. Pelo levantamento, feito depois da deduragem de Palocci, Lula não sofreu um arranhão sequer e segue vencendo em todos os cenários, contra qualquer adversário.
*Por Bepe Damasco