O ministro Paulo Guedes (Economia) afirmou a deputados federais nesta segunda-feira (8) que o governo deverá lançar o programa Renda Brasil para substituir o Bolsa Família logo após o fim da pandemia do novo coronavírus.
Segundo congressistas que participaram da reunião, o ministro disse que a iniciativa será um programa de transferência de renda para os mais vulneráveis e será mais abrangente do que o atual Bolsa Família. A ideia é incluir até informais identificados pelo governo Jair Bolsonaro e hoje são beneficiados pelo auxílio emergencial de R$ 600.
Guedes, porém, não deu detalhes sobre a iniciativa. Desde o ano passado, a equipe de Jair Bolsonaro trabalha em uma transformação do Bolsa Família e já previa mudar o nome do programa para Renda Brasil.
Segundo integrantes da equipe econômica disseram à Folha, diversas áreas do ministério estão fazendo estudos para aprimorar o desenho de programas sociais e usar melhor os recursos destinados a eles.
Para deputados, a decisão de lançar a iniciativa atrelada ao fim da pandemia é uma forma de o governo suprir o fim da ajuda financeira paga a parcela da população afetada pela pandemia.
O auxílio emergencial começou a ser pago em abril e a previsão era a de que ele durasse três meses. A última parcela do benefício ainda será paga, mas o governo deverá estender o pagamento do auxílio por mais dois meses, mas com um valor menor, de R$ 300.
Uma das análises feitas pelo ministro a deputados é que a pandemia ajudou o governo a atualizar a base de dados de informais e isso poderia ser aproveitado no novo programa. Na avaliação de dirigentes partidários e de integrantes do governo, os protestos contra o governo registrados neste domingo (7) foram embrionários, mas poderiam ser inflados no futuro com a participação de descontentes com o fim do auxílio emergencial.
Além de tentar barrar a insatisfação com o governo, o governo também alteraria de uma vez por todas o nome do programa que foi marca dos governos petistas. A reunião desta segunda com Guedes teve como objetivo discutir com líderes de partidos de centro da Câmara medidas a serem tomadas após a pandemia do coronavírus.
Os ministros Walter Braga Netto (Casa Civil) e Luiz Eduardo Ramos (Secretaria de Governo) também participaram. Segundo líderes partidários, o ministro da Economia falou que haverá dois choques passada a crise com a doença: um de empregos e outro de investimentos. Os investimentos viriam com o aporte de dinheiro público para obras do governo que gerariam empregos.
Esse braço está previsto no programa do governo chamado de pró-Brasil que teve inicialmente o repúdio de Guedes que o considerou o criticou por ser muito desenvolvimentista e parecido com programas do PT. Nesta segunda, Guedes acenou a ala militar do governo que defende o programa, sinalizando que pode colaborar com a iniciativa.
Congressistas disseram que o ministro da Economia e Braga Netto estavam em sintonia. Em outra frente, o titular da Economia também disse que o Renda Brasil teria um gatilho para incentivar os beneficiados a procurarem emprego.
Disse ainda que a carteira de trabalho verde amarela seria benéfica por desburocratizar processos de contratação e facilitar a a busca por empregos. Além disso, na reunião, os ministros do governo também pediram aos deputados empenho para aprovar a reforma tributária, administrativa, a autonomia do Banco Central, entre outros projetos.
Congressistas, por sua vez, pediram a Guedes que não mexa no Sistema S, como o governo já sinalizou que poderia fazer. O encontro, na avaliação de deputados, foi um gesto de aproximação do ministro da Economia com o Congresso.
Hoje, o Bolsa Família atende a famílias com filhos de 0 a 17 anos e que vivem em situação de extrema pobreza, com renda per capita de até R$ 89 mensais, e pobreza, com renda entre R$ 89,01 e R$ 178 por mês. O benefício médio foi de R$ 191,86 até março.
Temporariamente, durante a pandemia, o valor depositado a quase todas as famílias será o mesmo do auxílio emergencial dado a trabalhadores informais e microempreendedores —de R$ 600.
Técnicos do governo temem que, sem a ampliação do Bolsa Família, a fila aumente ainda mais. Mais pessoas devem sofrer corte na renda por causa da crise econômica e entrar na faixa considerada pobre ou extremamente pobre, que tem direito à transferência.
Assim que estourou a pandemia, Onyx Lorenzoni, recém-transferido para o Ministério da Cidadania, anunciou que em abril a cobertura do Bolsa Família, após sofrer sucessivos cortes, seria recorde. Mas não foi.
Foram 14,27 milhões de famílias beneficiadas em abril, contra 14,34 milhões em maio do ano passado. Em maio de 2020, a cobertura passou para 14,28 milhões, ainda sem retomar o patamar anterior à maior sequência de cortes na história do programa.
Com o afrouxamento do Orçamento neste ano por causa da pandemia, mais dinheiro foi destinado ao programa e o governo atende a mais pessoas carentes. Mas, conforme mostrou reportagem da Folha na semana passada, a fila de espera ainda persiste. São 433 mil famílias aptas a receber o benefício e que ainda aguardam liberação, segundo dados obtidos pela Folha por meio da Lei de Acesso à Informação.
Esta é a primeira vez que o Ministério da Cidadania revela oficialmente o tamanho da fila. Desde outubro do ano passado, quando a Folha mostrou o enxugamento no Bolsa Família, o governo se recusava a apresentar informações à imprensa e à Câmara, que cobrava respostas.
Sem dinheiro, a equipe de Bolsonaro passou a controlar o acesso ao programa a partir de junho de 2019. A fila chegou a 1 milhão de famílias em dezembro do ano passado e, no primeiro trimestre de 2020, a 1,6 milhão, segundo técnicos do governo que não quiseram ser identificados.
O valor extra para o Bolsa Família na pandemia permitiu que o Ministério da Cidadania incluísse cerca de 1,2 milhão de famílias. Isso, contudo, não representou uma retomada do programa ao período anterior aos cortes.
Norte e Nordeste ainda não se recuperaram totalmente (queda de aproximadamente 1,5%), enquanto que Sul e Sudeste registraram uma ampliação da cobertura —de 1,21% e 1,33%, respectivamente.