8 de janeiro, Dia da Vergonha

Não, não e não. Depois de ouvir tanto nos últimos meses sobre a inteligência privilegiada do mito, sobre sua condição de grande estrategista, me nego a acreditar que o ex-presidente Jair Bolsonaro estivesse por trás dessa nefasta invasão à sede dos Três Poderes da República se expondo a um desgaste inimaginável e transformando o8 de janeiro no Dia da Vergonha Nacional.

A estarrecedora facilidade com que os baderneiros, que não se conformam com a derrota de Jair Bolsonaro na eleição passada, invadiram e depredaram o Congresso Nacional, o Palácio do Planalto e o STF na tarde do último domingo, no maior ataque à democracia brasileira desde o fim da ditadura militar, parece esconder algo que a história há de revelar.

Seria o mito tão estúpido a ponto de mandar arregimentar por esse Brasil afora grupos de seguidores ou pseudos seguidores para uma missão tão absurda em troca sabe-se lá do quê, para a criminosa ação, até porque os ponderados e verdadeiross patriotas não se prestariam para uma investida criminosa como esta… grupo desorganizado, sem comando, a agir como um bando de aloprados – interessante como essa palavra me fez lembrar de algo no passado.

Será que o ex-presidente ou seus mais fiéis aliados, muitos deles fanáticos e inconseqüentes, cegos a ponto de seguir bradando por uma intervenção militar, financiadores desta intentona, não acharam que estava tudo fácil demais… que foram quase que recebidos com tapete vermelho a caminho da Praça dos Três Poderes, escoltados por policiais militares que não esboçaram a menor reação para conter a marcha… que no único embate real que experimentaram foram tão desproporcionais as forças que os pobres defensores das cercanias dos três poderes logo se renderam com um inexpressivo e receio dizer, inofensivo spray de pimenta como arma, ante uma massa agitada e ensandecida, formada por mais de 4 mil manifestantes…

Por fim, não acharam que para completar todo enredo dessa desastrada ação o Secretário da Segurança Pública do Distrito Federal estava viajando a passeio em Miami e o presidente Lula estava fora de Brasília, visitando uma cidade do interior de São Paulo, atingida pelas chuvas e dirigida por um velho aliado, de onde, mesmo sabedor da nefasta invasão, lá permaneceu até o início da noite para só então ganhar os holofotes, anunciar medidas, entre elas de intervenção na área da segurança e voltar a Brasília…

Não pretendo com isso incriminar ainda mais os responsáveis por essa barbárie cometida neste 8 de janeiro em Brasília ou fazer qualquer ilação entre os fatos e as partes envolvidas, mas como jornalista, sou obrigado a lançar o questionamento, diante de algo que me intriga. Há algo que não está batendo. As sedes dos três poderes da República guarnecidas, – quando já se sabia da manifestação há mais de 48 horas, – por uma estrutura que muito se assemelha a de uma portaria de prédio residencial, cuja única missão do porteiro é abrir o portão da garagem durante o dia e, a noite, em especial, tirar alguns bons cochilos.

Daí aconteceu o que se viu e se sabe e tanto nos entristece, restando apenas contabilizar os prejuízos materiais, porque os políticos já se sabe. A desastrosa ação dos aloprados bolsonaristas, logo chamados nas emissoras de TV de terroristas, golpistas e tantas denominações mais, repetidas à exaustão pelos repórteres e comentaristas políticos, serviu sim para carimbar os seguidores do ex-presidente Bolsonaro de radicais e extremistas, afugentando a partir daí milhares de brasileiros que seguiam induzidos pelo movimento à espera que algo acontecesse que pudesse mudar o resultado das urnas, mas que daqui para frente não emprestarão mais seus nomes ou seus rostos a atos que envergonham todo o Brasil.

A reação nacional e internacional, de todos os poderes e da sociedade civil, foi dura e serviu apenas para legitimar ainda mais o mandato conquistado nas urnas pelo presidente Lula através do voto popular, escanteando mais ainda o ex-presidente Jair Bolsonaro, hoje apontado como responsável pelo fracassado golpe, a ponto de já ter sua extradição dos Estados Unidas cogitada por parlamentares norte americanos.

Que as leis e a Constituição do País sejam respeitadas e usadas para punir exemplarmente os responsáveis pelos atos de vandalismo praticados na capital da República, incluindo as autoridades que se mostraram omissas ou praticaram o crime de inação ante uma situação tão extrema.

Mas antes de encerrar, permitam-me retomar: teria a malta insana agido levada pela tal tese de que deveria disseminar a violência, a desordem e a baderna, ensejando as Forças Armadas a agir, restaurando a ordem e devolvendo o poder a Bolsonaro, quem sabe após uma breve passagem pelas mãos do general Heleno… ou apenas mordido uma suculenta isca, cuidadosamente jogada para os radicais irresponsáveis serem fisgados como tilápia criada em tanque de pesque e pague…

*Paulo Roberto Sampaio é diretor de Redação da Tribuna.