Falta de crédito e burocracia travam o mercado imobiliário brasileiro, aponta levantamento

Uma conta simples demonstra como o setor imobiliário depende das ações do governo. Toda vez que o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) corta um ponto percentual nos juros básicos, a renda mínima exigida para financiar um imóvel cai de 6% a 8%. Os especialistas vão ainda mais fundo nessa conta. A queda de um ponto percentual na Selic faz com que 1 milhão de famílias se tornem aptas a conseguir financiamento imobiliário de até R$ 200 mil. Em 2017, os juros básicos caíram de 13% para 7% ao ano. A redução, portanto, tem potencial para incluir 6 milhões de famílias no mercado imobiliário brasileiro. Diante desses números, não seria exagero afirmar que, para destravar o setor, juros baixos são mais importantes do que aumento de salário. O raciocínio vale especialmente para os compradores de baixa renda, que respondem por 70% dos negócios. Para o fim de 2018, analistas projetam a Selic a 6,75% — mais trabalhadores, portanto, poderão sonhar com a casa própria.

O setor viveu nos últimos anos um período sombrio. Inflação e juros altos associados ao desemprego e ao desmoronamento da renda levaram a um ciclo inédito de prejuízos. Dados da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC) mostram que o ramo da construção civil fechou no vermelho pelo quarto ano consecutivo. De 2014 para cá, o setor eliminou 1 milhão de postos de trabalho. “Se não tivéssemos andado para trás, o PIB do Brasil em 2017 poderia ter crescido 1,3%”, diz José Carlos Martins, presidente da CBIC. Segundo as mais recentes projeções, o crescimento econômico será de no máximo 1%.

No mercado imobiliário, os indicadores também estão longe do azul. Entre novembro de 2016 e outubro de 2017, segundo dados da Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança (Abecip), foram aplicados R$ 45,6 bilhões na compra e construção de imóveis com recursos das cadernetas de poupança, o que representa uma retração de 0,9% ante os 12 meses precedentes. Em novembro, os financiamentos totalizaram R$ 31,5 bilhões, queda de 14,7% ante outubro, e os empréstimos englobaram 13,5 mil unidades, 14,6% menos que no mês anterior. O que explica números assim? Para ajustar as contas públicas, o governo cortou recursos, o que atingiu em cheio os negócios imobiliários. Em 2017, os investimentos federais caíram para o menor nível em uma década. O Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) sofreu perdas de 40,9% entre janeiro e outubro, enquanto o Minha Casa Minha Vida, principal programa dedicado à baixa renda, encolheu 61,4%.

Para tirar o pé de freio, o setor espera uma série de regulamentações e medidas administrativas por parte do governo. O principal ponto é destravar o crédito na Caixa, afetado pelas novas regras de Basileia, um acordo internacional que endurece os requisitos para a liberação de empréstimos. Nessa área, o governo já está se mexendo. No segundo dia do ano, a Caixa informou que vai ampliar de 50% para 70% a cota do financiamento de imóveis usados. É fácil entender a importância do banco: a Caixa detém 70% da carteira de crédito habitacional do país. Segundo José Carlos Martins, da CBIC, outro aspecto que precisa ser melhorado é a falta de agilidade do governo. Ele diz que há demora excessiva na contratação dos empreendimentos do programa Minha Casa Minha Vida. Estima-se que, das 20 mil unidades autorizadas em junho, apenas mil foram contratadas até agora.