A Lei Anticorrupção

Karla-Borges

Surgiu no ordenamento jurídico brasileiro em 2013, logo após as grandes manifestações sociais que assolaram o país, e a partir da próxima quarta-feira entrará em vigor para a União, Estados e Municípios, a Lei Anticorrupção, visando coibir e punir empresas que cometem atos lesivos à administração pública. Seguindo as tradições mundiais sobre a matéria, o texto foi fortemente influenciado pela Foreign Corrupt Practices Act (FCPA), aprovado pelo Congresso dos Estados Unidos em 1977’, após o caso Watergate, e pela UK Bribery Act, a conhecida “Lei da Propina” adotada pelo parlamento britânico em 2011, sendo considerada uma das legislações mais severas do mundo, embora existam diferenças nas punições administrativas e penais.

A nova Lei dispõe sobre a responsabilização objetiva administrativa e civil de pessoas jurídicas pela prática de atos contra a administração pública, nacional ou estrangeira, embora não exclua a responsabilidade individual de seus dirigentes ou administradores ou de qualquer pessoa natural, autora, co-autora ou partícipe do ato ilícito. A diferença é que a sociedade empresária será responsabilizada independentemente da responsabilização individual das pessoas naturais e os dirigentes ou administradores somente responderão por suas ações na medida da sua culpabilidade, ainda que haja alteração contratual, cisão ou fusão.

Constituem atos lesivos todos aqueles praticados pelas empresas que atentem contra princípios da administração pública ou compromissos internacionais assumidos pelo país como: prometer, oferecer ou dar, direta ou indiretamente, vantagem indevida a agente público, ou a terceira pessoa a ele relacionada; comprovadamente, financiar, custear, patrocinar ou de qualquer modo subvencionar a prática dos atos ilícitos; utilizar-se de interposta pessoa física ou jurídica para ocultar ou dissimular seus reais interesses ou a identidade dos beneficiários dos atos praticados.
Certamente também haverá maior rigor nas licitações, uma vez que o novo diploma veda: frustrar ou fraudar, mediante ajuste, o caráter competitivo de procedimento licitatório público; impedir, perturbar ou fraudar a realização de qualquer ato de processo licitatório; afastar ou procurar afastar licitante, por meio de fraude ou oferecimento de vantagem de qualquer tipo; fraudar licitação pública ou contrato dela decorrente; criar, de modo fraudulento ou irregular, pessoa jurídica para participar de certame ou celebrar contrato administrativo; obter vantagem ou benefício indevido, de modo espúrio, de modificações ou prorrogações de contratos celebrados com a administração pública, sem autorização em lei, no ato convocatório da licitação; manipular ou fraudar o equilíbrio econômico-financeiro dos contratos celebrados com a administração; dificultar atividade de investigação ou fiscalização de órgãos, entidades ou agentes públicos, ou intervir em sua atuação.

O dispositivo mais eficaz da Lei Anticorrupção é a penalidade imputada pelo seu descumprimento: a multa, no valor de 0,1% (um décimo por cento) a 20% (vinte por cento) do faturamento bruto do último exercício anterior ao da instauração do processo administrativo, excluídos os tributos, a qual nunca será inferior à vantagem auferida, quando for viável sua estimação. Caso não seja possível utilizar esse critério, a multa será de seis mil a sessenta milhões. A instauração e o julgamento de processo administrativo para apuração da responsabilidade de pessoa jurídica cabem à autoridade máxima de cada órgão ou entidade dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, que agirá de ofício ou mediante provocação, observados o contraditório e a ampla defesa.

O ente público, por meio do seu órgão de representação judicial, ou equivalente, poderá requerer as medidas judiciais necessárias para a investigação e o processamento das infrações, inclusive de busca e apreensão. A autoridade máxima ou entidade pública poderá celebrar acordo de leniência com as empresas para que colaborem com as investigações e o processo administrativo, sendo que dessa colaboração resulte a identificação dos demais envolvidos na infração, e a obtenção célere de informações e documentos que comprovem o ilícito sob apuração, isentando-as de algumas punições previstas, todavia esse acordo não as exime da obrigação de reparar integralmente o dano causado. Vale ressaltar que na esfera administrativa, a responsabilidade das pessoas jurídicas não afasta a possibilidade de sua responsabilização na esfera judicial.

Outra novidade é a criação no âmbito do Poder Executivo Federal do Cadastro Nacional de Empresas Punidas – CNEP, que reunirá e dará publicidade às sanções aplicadas pelos órgãos ou entidades dos três Poderes de todas as esferas de governo às empresas infratoras. Entretanto, para que esse fato torne-se realidade, necessita-se, pois, que Estados e Municípios criem mecanismos para aplicação da nova lei, já que se trata de lei nacional que abrange todos os entes da Federação. Há nos próximos dias grande expectativa em torno da regulamentação por parte da União com a publicação do Decreto Presidencial, visto que dentre as sanções previstas está a dissolução compulsória das pessoas jurídicas. Finalmente, a Lei 12.846/13 surge para dar efetividade de uma vez por todas ao princípio da moralidade previsto no artigo 37 da Constituição Federal.

Karla Borges é Auditora Fiscal da Secretaria Municipal da Fazenda do Salvador há 23 anos, graduada em Administração de Empresas (UFBA) e Direito (FDJ) ,Pós-Graduada em Administração Tributária (UEFS), Direito Tributário, Direito Tributário Municipal (UFBA), Economia Tributária (George Washington University) e Especialista em Cadastro pelo Instituto de Estudios Fiscales de Madrid.

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